Brasileiros confirmam que estrelas na borda da Via Láctea são as mais novas

Grupo internacional de pesquisadores analisou a idade de mais de 100 mil estrelas
Você já ouviu a palavra “halo” antes: ela é uma das favoritas de Beyoncé, e está na ponta de língua dos fãs do game homônimo. Mas ela não é exclusividade da produção cultural terráquea: também há um halo galático no entorno da Via Láctea. Uma das traduções possíveis para o termo, em português, é auréola, o que ajuda a entender o que exatamente é esse pedaço da anatomia cósmica: uma espécie de nuvem dispersa e arredondada que fica em volta da nossa galáxia. Agora, um grupo internacional de cientistas resolveu dar uma de IBGE e fez o censo demográfico do céu. Mais precisamente, foram “entrevistadas” mais de 130 mil estrelas do tipo BHB que compõe o halo da Via Láctea para montar este mapa cronográfico.

Na equipe, estão os brasileiros Rafael Miloni Santucci e Silvia Rossi, do Instituto de Astronomia e Geofísica (IAG) da USP, e Vinicius Moris Placco, da Universidade de Notre Dame. O resultado da pesquisa? Quanto mais próximos das bordas da galáxia estão os astros, mais novos, no geral, eles são. E esse dado é essencial para compreender a formação da Via Láctea. O artigo foi publicado na revista científica Nature. Os cientistas se basearam em informações do SDSS (Sloan Digital Sky Survey), um levantamento digital completo do céu financiado pelo Departamento de Energia dos Estados Unidos. Além disso, Santucci já havia trabalhado com o assunto antes em sua tese de doutorado

Para os parâmetros do ser humano, quase tudo que existe no espaço é muito, muito antigo, mas na prática há uma diferença de idade considerável entre um astro na mais tenra idade e um ancião. Um dos corpos celestes mais jovens já observados é um dos planetas da estrela V830 Tau, com "apenas" 2 milhões de anos, um bebê na escala astronômica. Já a estrela SMSS J031300.36-670839.3 — e você achando que Schwarzenegger era difícil de soletrar —, é só um pouco mais nova do que o Big Bang, ou seja, tem pelo menos 13 bilhões de anos (ela já estava lá quando a Terra nem sonhava em existir). 

Da mesma forma que acontece em nosso planeta, no espaço também são os idosos quem têm mais história para contar. “É no halo que encontramos algumas das estrelas mais velhas da galáxia”, diz a GALILEU Rafael Miloni Santucci, do Instituto de Astronomia e Geofísica (IAG) da USP. “Ao estudar esses astros cuidadosamente, podemos, por exemplo, verificar a abundância de elementos químicos e entender um pouco mais da evolução química de uma galáxia – e também do universo.”

A sigla do tipo de estrela analisado, BHB, significa, em inglês, “estrela azul de ramo horizontal”. São estrelas que já passaram do estágio de gigante vermelha. Em outras palavras, já não são mais crianças, e são especialmente brilhantes, o que ajuda na hora de avaliar suas características. Para descobrir a idade de mais de 100 mil dessas de tão longe, é necessário verificar variações de cor que não são perceptíveis a olho nu por meio de outra frequência de onda. A ideia é simples: se elas ainda estiverem vermelhinhas, estão saindo da fase anterior, o que significa que são mais jovens do que as azulonas.

A conclusão é que as mais vermelhas estão mais próximas da borda do halo, na última fronteira da Via Láctea. Ou seja: os gases que formaram a nossa galáxia colapsaram de dentro para fora, e foi nessa ordem que as estrelas foram criadas. Embora astrônomos  já suspeitassem disso, pela primeira vez a possibilidade foi demonstrada na prática.

A descoberta pode ajudar a explicar a formação de outras galáxias em forma de espiral, mas Santucci é cuidadoso com generalizações. “Nada garante que ao aplicar a mesma técnica na galáxia de Andromeda, por exemplo, veremos o mesmo resultado”, explica o cientista. “Quem sabe se o processo de formação da nossa galáxia é regra ou exceção no Universo? A história da astronomia mostra que temos a tendência de errar quando achamos que somos o centro de tudo.”

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