Como os buracos negros moldam galáxias
Num
novo estudo, os cientistas analisaram oito anos de observações do XMM-Newton do
buraco negro no centro de uma galáxia ativa conhecida como PG 1114+445,
mostrando como os ventos ultrarrápidos - fluxos de gás emitidos do disco de
acreção muito próximo do buraco negro - interagem com a matéria interestelar
nas partes centrais da galáxia. Estes fluxos já tinham sido vistos antes, mas o
novo estudo identifica claramente, e pela primeira vez, três fases da sua
interação com a galáxia hospedeira.
"Estes
ventos podem explicar algumas correlações surpreendentes que os cientistas
conhecem há anos, mas que não conseguiam explicar," disse o autor
principal Roberto Serafinelli do Instituto Nacional de Astrofísica de Milão,
Itália, que realizou a maior parte do trabalho como parte do seu doutoramento
na Universidade de Roma Tor Vergata.
"Por
exemplo, vemos uma correlação entre as massas de buracos negros supermassivos e
a dispersão de velocidade das estrelas nas partes internas das suas galáxias
hospedeiras. Mas não há como tal se deva ao efeito gravitacional do buraco
negro. O nosso estudo mostra, pela primeira vez, como estes ventos de buracos
negros impactam a galáxia em maior escala, possivelmente fornecendo o elo que
faltava."
Os
astrónomos já haviam detetado dois tipos de fluxos nos espectros de raios-X
emitidos pelos núcleos ativos das galáxias, as densas regiões centrais das
galáxias conhecidas por conter buracos negros supermassivos. Os chamados fluxos
ultrarrápidos (em inglês "ultra-fast outflows", ou UFOs), feitos de
gás altamente ionizado, viaja a velocidades de até 40% da velocidade da luz e
são observáveis nas proximidades do buraco negro central.
Os
fluxos mais lentos, conhecidos como absorvedores quentes, viajam a velocidades
muito mais baixas, de centenas de quilómetros por segundo, e possuem
características físicas semelhantes - como densidade de partículas e ionização
- à matéria interestelar circundante. É mais provável que esses fluxos mais
lentos sejam detetados a distâncias maiores dos centros das galáxias.
No
novo estudo, os cientistas descrevem um terceiro tipo de fluxo que combina
características dos dois anteriores: a velocidade de um UFO e as propriedades
físicas de um absorvedor quente.
Este
arrasto acontece a uma distância de dezenas a centenas de anos-luz do buraco
negro. O UFO gradualmente empurra a matéria interestelar para longe das partes
centrais da galáxia, limpando-a do gás e diminuindo a acreção da matéria em
redor do buraco negro supermassivo. Embora
os modelos já tenham previsto antes este tipo de interação, o estudo atual é o
primeiro a apresentar observações reais das três fases. Esta primeira interação acontece muitos anos
depois do UFO ter deixado o buraco negro. Mas a energia do UFO permite que o
buraco negro relativamente pequeno tenha impacto sobre o material muito além do
alcance da sua força gravitacional.
De
acordo com os cientistas, os buracos negros supermassivos transferem a sua
energia para o ambiente circundante através desses fluxos e gradualmente limpam
as regiões centrais da galáxia de gás, o que pode então interromper a formação
estelar. De facto, as galáxias de hoje produzem estrelas com muito menos
frequência do que costumavam nos estágios iniciais da sua formação.
A
resolução de energia sem precedentes do XMM-Newton foi fundamental para
diferenciar os três tipos de características correspondentes aos três tipos de
fluxos. No futuro, com observatórios novos e mais poderosos, como o ATHENA
(Advanced Telescope for High ENergy Astrophysics) da ESA, os astrónomos poderão
observar centenas de milhares de buracos negros supermassivos, detetando estes
fluxos mais facilmente. ATHENA, que será mais de 100 vezes mais sensível do que
o XMM-Newton, deverá ser lançado no início da década de 2030.
Mais
dados, no futuro, vão ajudar a desvendar as complexas interações entre os
buracos negros supermassivos e as suas galáxias hospedeiras em detalhe e a
explicar a diminuição na formação estelar que os astrónomos observam ter
ocorrido ao longo de bilhões de anos.
Fonte: ESA
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