A origem de um buraco negro supermassivo no Universo jovem

 O buraco negro no centro da galáxia M87. Crédito: Colaboração EHT

Os buracos negros supermassivos têm entre vários milhões e milhares de milhões de vezes a massa do nosso Sol. A Via Láctea hospeda um buraco negro supermassivo com alguns milhões de massas solares. Surpreendentemente, observações astrofísicas mostram que os buracos negros supermassivos já existiam quando o Universo era muito jovem. Por exemplo, encontramos buracos negros com mil milhões de vezes a massa do Sol quando o Universo tinha apenas 6% da sua idade atual, 13,7 mil milhões de anos. Como é que estes buracos negros supermassivos no início do Universo foram formados? 

Uma equipa liderada por um físico teórico da Universidade da Califórnia, em Riverside, apresentou uma explicação: um enorme buraco negro "semente" que o colapso de um halo de matéria escura poderia produzir. 

O halo de matéria escura é o halo de matéria invisível que rodeia uma galáxia ou um enxame de galáxias. Embora a matéria escura nunca tenha sido detetada em laboratórios, os físicos continuam confiantes de que esta matéria misteriosa que constitui 85% da matéria do Universo existe. Se a matéria visível de uma galáxia não estivesse embebida num halo de matéria escura, esta matéria dispersar-se-ia. 

"Os físicos estão intrigados com a razão porque os buracos negros supermassivos no início do Universo, que estão localizados nas regiões centrais de halos de matéria escura, crescem tão massivamente num curto período de tempo," disse Hai-Bo Yu, professor associado de física e astronomia na Universidade da Califórnia, em Riverside, que liderou o estudo publicado na revista The Astrophysical Journal Letters. 

 "É como uma criança de cinco anos que pesa, digamos, 100 quilos. Esta criança surpreender-nos-ia a todos nós, porque sabemos o típico peso de um bebé recém-nascido e quão rápido este bebé pode crescer. No que diz respeito aos buracos negros, os físicos têm expetativas gerais sobre a massa de um buraco negro "semente" e do seu ritmo de crescimento. A presença de buracos negros supermassivos sugere que estas expetativas gerais foram violadas, exigindo novos conhecimentos. E isto é empolgante."

 Um buraco negro "semente" é um buraco negro no seu estágio inicial - semelhante ao estágio de bebé na vida de um ser humano. 

"Podemos pensar em duas razões," acrescentou Yu. "A 'semente' - ou 'bebé' - ou é muito mais massiva ou cresce mais depressa do que pensávamos, ou ambos. A questão que então surge é quais são os mecanismos físicos para produzir um buraco negro 'semente' massivo o suficiente ou para atingir um ritmo de crescimento suficientemente rápido?" 

"Os buracos negros levam tempo para crescerem através da acreção de matéria em redor," disse o coautor Yi-Ming Zhong, investigador pós-doutorado no Instituto Kavli para Física Cosmológica da Universidade de Chicago. "O nosso artigo científico mostra que, se a matéria escura tem auto-interações, então o colapso gravotérmico de um halo pode levar a um buraco negro 'semente' massivo o suficiente. A sua taxa de crescimento seria mais consistente com as expetativas gerais." 

Na astrofísica, um mecanismo popular usado para explicar os buracos negros supermassivos é o colapso de gás pristino em protogaláxias no início do Universo. 

"Este mecanismo, no entanto, não consegue produzir um buraco negro 'semente' massivo o suficiente para acomodar os buracos negros supermassivos observados recentemente - a menos que o buraco negro 'semente' tenha tido um ritmo de crescimento extremamente elevado," disse Yu. "O nosso trabalho fornece uma explicação alternativa: um halo de matéria escura auto-interativa que sofre instabilidade gravotérmica e a sua região central colapsa num buraco negro 'semente'." 

A explicação que Yu e seus colegas propõem funciona da seguinte maneira: 

As partículas de matéria escura primeiro aglomeram-se sob a influência da gravidade e formam um halo de matéria escura. Durante a evolução do halo, operam duas forças concorrentes - a gravidade e a pressão. Enquanto a gravidade puxa as partículas de matéria escura para dentro, a pressão empurra-as para fora. 

Se as partículas de matéria escura não interagem umas com as outras, então à medida que a gravidade as puxa em direção ao halo central, tornam-se mais quentes, isto é, movem-se mais depressa, a pressão aumenta efetivamente e depois "ressaltam". No entanto, no caso da matéria escura auto-interativa, estas interações entre as partículas podem transportar o calor daquelas partículas "mais quentes" para as próximas mais frias. Isto dificulta o "ressalto" das partículas de matéria escura. 

Yu explicou que o halo central, que entraria em colapso num buraco negro, tem momento angular, ou seja, gira. As auto-interações podem induzir viscosidade, ou "fricção", que dissipa o momento angular. Durante o processo de colapso, o halo central, que tem uma massa fixa, encolhe em raio e diminui em rotação devido à viscosidade. À medida que evolui, o halo central eventualmente colapsa num estado singular: um buraco negro "semente". Esta "semente" pode tornar-se mais massiva acretando matéria bariónica - ou visível - circundante, como gás e estrelas. 

"A vantagem do nosso cenário é que a massa do buraco negro 'semente' pode ser alta, pois é produzida pelo colapso de um halo de matéria escura," disse Yu. "Portanto, pode transformar-se num buraco negro supermassivo ao longo de uma escala de tempo relativamente curta." 

Este trabalho é novo, no sentido de que os investigadores identificam a importância dos bariões - partículas atómicas e moleculares comuns - para que esta ideia funcione. 

"Primeiro, mostramos que a presença de bariões, como gás e estrelas, podem acelerar significativamente o início do colapso gravotérmico de um halo e um buraco negro 'semente' pode ser criado a tempo," disse Wei-Xiang Feng, estudante de Yu e coautor do artigo. "Em segundo lugar, mostramos que as auto-interações podem induzir viscosidade que dissipa o momento angular remanescente do halo central. E terceiro, desenvolvemos um método para examinar a condição que desencadeia a instabilidade relativística geral do halo colapsado, o que garante que um buraco negro 'semente' possa formar-se caso a condição seja satisfeita." 

Durante a última década, Yu explorou novas previsões de auto-interações da matéria escura e as suas consequências observacionais. O seu trabalho mostrou que a matéria escura auto-interativa pode fornecer uma boa explicação para o movimento observado de estrelas e do gás nas galáxias. 

"Em muitas galáxias, as estrelas e o gás dominam as suas regiões centrais," disse. "Assim, é natural perguntar como a presença desta matéria bariónica afeta o processo de colapso. Nós mostramos que vai acelerar o início do colapso. Esta característica é exatamente o que precisamos para explicar a origem dos buracos negros supermassivos no início do Universo. As interações entre partículas de matéria escura também levam à viscosidade que pode dissipar o momento angular do halo central e ajudar ainda mais no processo de colapso."

Fonte: Astronomia OnLine

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