As galáxias morrem mais cedo do que o previsto
Durante muito tempo, os cientistas pensaram que, no Universo primitivo, apenas se observariam galáxias com formação estelar ativa. O Telescópio Espacial James Webb revela agora que as galáxias deixaram de formar estrelas mais cedo do que se esperava.
Três espetros obtidos pelo NIRSpec sobrepostos a uma imagem obtida pelo NIRCam, dois instrumentos a bordo do Telescópio Espacial James Webb. A galáxia recorde é mostrada no meio. Aparece a vermelho na imagem e o seu espetro diminui para a esquerda (comprimentos de onda curtos). Para comparação, os espetros em cima e em baixo, em azul e violeta, mostram galáxias típicas com formação estelar numa altura semelhante da história cósmica. Crédio: NASA/CSA/ESA, A. Weibel, P. A. Oesch (Universidade de Genebra), equipa RUBIES - A. de Graaff (Instituto Max Planck de Astronomia em Heidelberg), G. Brammer (Instituto Niels Bohr), Arquivo DAWN do JWST
Uma descoberta recente de uma
equipe internacional, liderada por astrónomos da Universidade de Genebra
(UNIGE), aprofunda a tensão entre os modelos teóricos da evolução cósmica e as
observações reais. Entre centenas de espetros obtidos com o programa RUBIES do
Webb, a equipe encontrou uma galáxia recorde que já tinha parado de formar
estrelas durante uma época em que as galáxias estão normalmente a crescer muito
rapidamente. Este estudo foi publicado na revista The Astrophysical Journal.
Nos primórdios do Universo, uma
galáxia típica acreta gás do meio intergaláctico circundante e transforma esse
gás em estrelas. Este processo aumenta a sua massa, levando a uma acreção de
gás ainda mais eficiente e a uma formação estelar acelerada. No entanto, as
galáxias não crescem indefinidamente, devido a um processo que os astrónomos
designam por "extinção".
No Universo local, cerca de
metade das galáxias observadas deixaram de formar estrelas - extinguiram-se e
deixaram de crescer. Os astrónomos referem-se a elas como galáxias quiescentes,
extintas ou "vermelhas e mortas". Aparecem vermelhas porque já não
contêm estrelas azuis jovens e brilhantes - apenas restam estrelas vermelhas
mais velhas e mais pequenas.
Uma fração particularmente
elevada de galáxias quiescentes é encontrada entre as galáxias massivas, que
são frequentemente observadas como tendo morfologias elípticas. Normalmente, a
formação destas galáxias vermelhas e mortas demora muito tempo, porque têm de
acumular um grande número de estrelas antes de o processo de formação estelar
ser finalmente interrompido. O que realmente causa a extinção nas galáxias é
ainda um grande enigma.
"Encontrar os primeiros
exemplos de galáxias massivas quiescentes (GMQs) no Universo primitivo é
fundamental, uma vez que lança luz sobre os seus possíveis mecanismos de
formação", afirma Pascal Oesch, professor associado do Departamento de Astronomia
da Faculdade de Ciências da UNIGE e coautor do artigo científico. A procura de
tais sistemas tem sido um objetivo importante dos astrónomos desde há anos.
Observações em desacordo
com as expetativas teóricas
Com o avanço da tecnologia, em
particular a espetroscopia no infravermelho próximo, os astrónomos confirmaram
a existência de galáxias massivas quiescentes (GMQs) em épocas cósmicas cada
vez mais precoces. A sua abundância inferida tem sido difícil de conciliar com
os modelos teóricos de formação galáctica, que preveem que tais sistemas
deveriam demorar mais tempo a formar-se. Com o Telescópio Espacial James Webb,
esta tensão foi levada até um desvio para o vermelho de 5 (1,2 mil milhões de
anos após o Big Bang), onde várias GMQs foram confirmadas nos últimos anos. O
novo estudo liderado pela UNIGE revela que estas galáxias se formaram ainda
mais cedo e mais rapidamente do que se pensava.
No Ciclo 2 do JWST, o
levantamento RUBIES (Red Unknowns: Bright Infrared Extragalactic Survey), um
dos maiores programas europeus de investigação extragalática que utiliza o
instrumento NIRSpec, obteve observações espetroscópicas de vários milhares de
galáxias, incluindo centenas de fontes recém-descobertas a partir de dados
iniciais do JWST.
Uma galáxia
"morta" recordista
Entre estes novos espetros, os
cientistas identificaram a galáxia massiva quiescente mais distante encontrada
até à data, com um desvio para o vermelho espetroscópico de 7,29, apenas ~700
milhões de anos após o Big Bang. O espetro do NIRSpec/PRISM revela uma
população estelar surpreendentemente antiga num Universo tão jovem. A modelação
detalhada do espetro e dos dados de imagem mostram que a galáxia formou uma
massa de mais de 10 mil milhões (10^10) de sóis nos primeiros 600 milhões de
anos após o Big Bang, antes de cessar rapidamente a formação estelar,
confirmando assim a sua natureza quiescente.
"A descoberta desta galáxia,
designada RUBIES-UDS-QG-z7, implica que as galáxias massivas quiescentes nos
primeiros mil milhões de anos do Universo são mais de 100 vezes mais abundantes
do que o previsto por qualquer modelo até à data", afirma Andrea Weibel,
doutoranda do Departamento de Astronomia da Faculdade de Ciências da UNIGE e
primeira autora do artigo científico. Isto, por sua vez, sugere que
fatores-chave nos modelos teóricos (por exemplo, os efeitos dos ventos
estelares e a força dos fluxos alimentados pela formação de estrelas e buracos
negros massivos) podem ter de ser revistos. As galáxias morreram muito mais
cedo do que estes modelos podem prever.
Perspetivas sobre os
núcleos das galáxias gigantes
Finalmente, a pequena dimensão
física de RUBIES-UDS-QG-z7, medida em apenas ~650 anos-luz, implica uma elevada
densidade de massa estelar comparável às maiores densidades centrais observadas
em galáxias quiescentes a desvios para o vermelho ligeiramente inferiores
(z~2-5). Estas galáxias são suscetíveis de evoluir para os núcleos das galáxias
elípticas mais antigas e mais massivas do Universo local.
"A descoberta de
RUBIES-UDS-QG-z7 fornece a primeira forte evidência de que os centros de
algumas galáxias elípticas massivas próximas podem já ter existido desde as
primeiras centenas de milhões de anos do Universo", conclui Anna de
Graaff, investigadora principal do programa RUBIES, investigadora de
pós-doutoramento no Instituto Max Planck de Astronomia em Heidelberg e segunda
autora do artigo científico.
Astronomia OnLine
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