A colisão de estrelas de neutrões como uma nova forma de medir a expansão do Universo
Nos últimos anos, a astronomia tem-se visto numa espécie de crise: embora saibamos que o Universo está a expandir-se, e embora saibamos aproximadamente a que velocidade, as duas principais formas de medir essa expansão não estão de acordo. Agora, astrofísicos do Instituto Niels Bohr sugerem um novo método que pode ajudar a resolver esta tensão.
As galáxias estão relativamente paradas no espaço, mas o próprio espaço está a expandir-se. Isto faz com que as galáxias se afastem umas das outras a uma velocidade cada vez maior. No entanto, o valor exato é ainda misterioso. Crédito: ESO/L. Calçada
O Universo está em expansão
Sabemos
isto desde que Edwin Hubble e outros astrónomos, há cerca de 100 anos, mediram
as velocidades de um certo número de galáxias circundantes. As galáxias do
Universo são "transportadas" para longe umas das outras por esta
expansão e, por conseguinte, afastam-se umas das outras.
Quanto
maior for a distância entre duas galáxias, mais rapidamente se afastam, e o
ritmo exato deste movimento é uma das grandezas mais fundamentais da cosmologia
moderna. O número que descreve a expansão tem o nome de "constante de
Hubble", aparecendo numa multiplicidade de equações e modelos diferentes
do Universo e dos seus constituintes.
A tensão de Hubble
Para
compreender o Universo, temos, portanto, de conhecer a constante de Hubble com
a maior exatidão possível. Existem vários métodos para a medir; métodos que são
mutuamente independentes, mas que, felizmente, dão quase o mesmo resultado.
QUASE o mesmo resultado...
O
método intuitivamente mais fácil de compreender é, em princípio, o mesmo que
Edwin Hubble e os seus colegas utilizaram há um século: localizar um conjunto
de galáxias e medir as suas distâncias e velocidades. Na prática, isto é feito
através da procura de galáxias com estrelas em explosão, as chamadas
supernovas. Este método é complementado por outro método que analisa
irregularidades na chamada radiação cósmica de fundo, uma forma antiga de luz
que remonta a pouco tempo depois do Big Bang.
Os
dois métodos - o método das supernovas e o método da radiação de fundo - têm
dado sempre resultados ligeiramente diferentes. Mas qualquer medição tem
incertezas e, há alguns anos atrás, as incertezas eram suficientemente
substanciais para que as pudéssemos culpar pela disparidade.
No
entanto, à medida que as técnicas de medição foram melhorando, as incertezas
diminuíram e chegámos agora a um ponto em que podemos afirmar com um elevado
grau de confiança que ambos não podem estar corretos.
A
raiz desta "tensão de Hubble" - quer se trate de efeitos
desconhecidos que enviesam sistematicamente um dos resultados, quer se trate de
um indício de uma nova física ainda por descobrir - é atualmente um dos temas
mais quentes da astronomia.
A
colisão de estrelas de neutrões pode ajudar a encontrar a resposta
Um
dos maiores desafios consiste em determinar com exatidão as distâncias das
galáxias. Mas num novo estudo, Albert Sneppen, que é estudante de doutoramento
em astrofísica no Cosmic Dawn Center do Instituto Niels Bohr em Copenhaga,
propõe um novo método para medir distâncias, ajudando assim a resolver a
disputa em curso.
Ilustração
dos dois métodos utilizados para medir a expansão do Universo: o hemisfério
esquerdo mostra o remanescente em expansão da supernova descoberta por Tycho
Brahe em 1572, aqui observada em raios X. À direita, um mapa da radiação
cósmica de fundo de uma metade do céu, observada em micro-ondas. Crédito:
esquerda - NASA/CXC/Rutgers/J.Warren & J.Hughes et al.; direita -
NASA/Equipa de Ciência da missão WMAP
"Quando duas estrelas de neutrões ultracompactas - que são, elas próprias, remanescentes de supernovas - se orbitam uma em torno da outra e acabam por se fundir, dão azo a numa nova explosão, a chamada quilonova", explica Albert Sneppen. "Recentemente, demonstrámos que esta explosão é extraordinariamente simétrica e verificámos que esta simetria não só é bela, como também incrivelmente útil".
Num
outro estudo publicado há poucos dias, o prolífico estudante de doutoramento
mostra que as quilonovas, apesar da sua complexidade, podem ser descritas por
uma única temperatura. E verifica-se que a simetria e a simplicidade das
quilonovas permitem aos astrónomos deduzir exatamente a quantidade de luz que
emitem.
Comparando
esta luminosidade com a quantidade de luz que chega à Terra, os investigadores
podem calcular a distância a que a quilonova se encontra. Obtiveram assim um
método novo e independente para calcular a distância a galáxias que contêm
quilonovas.
Darach
Watson é professor associado no Cosmic Dawn Center e coautor do estudo. Ele
explica: "As supernovas, que até agora têm sido utilizadas para medir as
distâncias das galáxias, nem sempre emitem a mesma quantidade de luz. Além
disso, exigem que se calibre primeiro a distância utilizando outro tipo de
estrelas, as chamadas Cefeidas, que, por sua vez, também têm de ser calibradas.
Com as quilonovas podemos contornar estas complicações que introduzem
incertezas nas medições".
Confirmação de um dos dois métodos
Para
demonstrar o seu potencial, os astrofísicos aplicaram o método a uma quilonova
descoberta em 2017. O resultado é uma constante de Hubble mais próxima da do
método da radiação de fundo, mas os investigadores ainda não se atrevem a
afirmar que o método da quilonova pode resolver a tensão de Hubble:
"Só
temos este estudo de caso até agora e precisamos de muitos mais exemplos antes
de podermos estabelecer um resultado robusto", adverte Albert Sneppen.
"Mas o nosso método, pelo menos, contorna algumas fontes conhecidas de
incerteza e é um sistema muito 'limpo' de estudo. Não requer calibração, nem
fator de correção".
Fonte:
Astronomia OnLine
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