Passagem da Bíblia tem o registro mais antigo de um eclipse solar
Está circulando há cerca de 2.500 anos e deve ter sido lida
por milhões e milhões de pessoas. Mas a primeira menção a um eclipse solar
tinha passado despercebida até agora. Em uma pesquisa que combina análise
linguística de idiomas milenares, antigos escritos astronômicos da Babilônia,
estelas (pedras com inscrições) do Egito dos faraós e modernos cálculos da
maquinaria celeste, cientistas britânicos acreditam ter encontrado na Bíblia o
primeiro registro de um eclipse solar anular.
Deixando de lado a historicidade da Bíblia, ao longo dela há
muitas passagens históricas contando a evolução dos israelitas. A arqueologia e
a história comparada confirmaram a existência de muitos personagens, lugares e
fatos históricos, ao mesmo tempo em que descartaram muitos outros míticos. Um
desses personagens é Josué, profeta tanto para judeus quanto para cristãos e
muçulmanos, e caudilho e sucessor de Moisés à frente dos hebreus. Josué foi, de
acordo com a tradição bíblica, aquele que finalmente conquistou a terra prometida
e a dividiu entre as 12 tribos. Suas peripécias e muitas guerras foram
registradas no livro homônimo do Antigo Testamento.
No Livro de Josué (10:12-13), lê-se a seguinte passagem:
“Josué falou ao Senhor no dia em que ele entregou os
amorreus nas mãos dos filhos de Israel, e disse em presença dos israelitas:
«Sol, detém-te sobreGibeão, e tu, ó Lua, sobre o vale de
Ajalon».
E o Sol se deteve e a Lua parou, até que o povo se vingou de
seus inimigos.
Isto está escrito no Livro do Justo. E, de fato, o Sol parou
no zênite e não se moveu durante quase um dia inteiro”.
A lenda bíblica diz que Josué pediu a Jeová parar o Sol e a
Lua
Lido ao pé da letra, o relato é tão mítico como a separação
das águas do Mar Vermelho por Moisés. Mas um grupo de pesquisadores britânicos
acredita que a leitura literal esconde o que realmente aconteceu. As várias
traduções modernas do conteúdo bíblico partem da primeira tradução, do hebraico
e do aramaico para o grego. Talvez tenha sido aí que se perdeu o significado
real das palavras até ficar no que parece dizer: que a Lua e o Sol pararam.
“Mas indo ao texto hebraico original, pensamos que outro
possível significado seria que o Sol e a Lua deixaram de fazer o normalmente fazem:
pararam de brilhar”, diz o pesquisador da Universidade de Cambridge e coautor
da pesquisa, Colin Humphreys, um apaixonado por colocar a lupa da ciência na
Bíblia. Concretamente, o texto original usa as palavras hebraicas dôm e ‘amad
para designar o que o Sol e a Lua fizeram, respectivamente. A primeira tem
vários significados, de estar em silêncio a emudecer, passando por permanecer
imóvel. A segunda significa tanto deter-se quanto parar ou manter.
Para ajudar essa alternativa, os autores do estudo, publicado
pela revista Astronomy and Geophysics, ressaltam que a palavra dôm compartilha
raiz com termos astronômicos referentes a eclipses encontrados em tabuletas
babilônicas da mesma época. “Nesse contexto, as palavras hebraicas poderiam se
referir a um eclipse solar, quando a Lua passa entre a Terra e o Sol e este
parece parar de brilhar”, observa Humphreys. Em particular, aposta em um
eclipse anular, no qual o satélite não consegue esconder toda a estrela,
deixando ver uma espécie de anel de fogo.
Outra prova circunstancial que os pesquisadores colocam
sobre a mesa tem a ver com a historicidade da presença de Josué e dos
israelitas nas terras de Canaã há 3.200 anos. Essa parte da história é
confirmada na estela de Merneptah, um longo texto escrito em um bloco de
granito é conservado no Museu Egípcio do Cairo. Merneptah, filho do faraó
Ramsés II, o Grande, reinou entre 1213 e 1203 a. C., de acordo com as
cronologias mais aceitas. A estela, gravada no quinto ano do seu reinado,
registra como Merneptah teve que enviar tropas a Canaã para ajudar vários de
seus feudos que estavam sendo assediados pelos israelitas. São as guerras que o
Livro de Josué reúne, embora ambos os textos não coincidam em relação a quem
ganhou.
Delimitados os fatos e os personagens históricos, os
pesquisadores lançaram a máquina de calcular eclipses, algo não tão simples
como se acredita. “Podemos calcular eclipses futuros ou passados. Mas quanto
mais voltamos no tempo, mais temos de levar em consideração as mudanças na
velocidade de rotação da Terra”, explica o físico britânico. O movimento do
planeta sobre si mesmo não é constante. “Somente nos últimos 20 anos
conseguimos fazer esses cálculos para eclipses realmente antigos”, acrescenta
Humphreys.
As variações da velocidade de rotação da Terra complicam o
cálculo de eclipses passados e futuros
De acordo com suas estimativas, o único eclipse anular
visível em Gibeão, a poucos quilômetros a nordeste de Jerusalém, entre 1500 e
1050 a. C. aconteceu (seguindo o calendário atual) às 15h27 de 30 de outubro de
1207 a. C. O Sol ainda deveria estar parcialmente eclipsado no crepúsculo, às
17h38. Durante a fase central do eclipse, a Lua cobriu até 86% da área do disco
solar, reduzindo a visibilidade a um décimo da habitual. A passagem da Bíblia não
mente, embora exagere um pouco.
Se a data for aceita pela comunidade científica, seria o
registro mais antigo de um eclipse solar. Embora existam referências a pelo
menos outros três possíveis eclipses anteriores ao ano 1000 a. C. em uma lenda
chinesa, uma tabuleta da Mesopotâmia ou na Odisseia de Homero, nenhuma delas
resistiu aos cálculos astronômicos. É preciso avançar até 700 a. C., quando os
chineses começaram a registrar os eclipses. Na época, os assírios os gravavam
em tabuletas de argila.
Esses registros são fundamentais para a história da
Astronomia, mas também para fixar outros eventos da história. O eclipse solar
de 15 de junho de 763, visto sobre as terras da Mesopotâmia, serviu para datar
grande parte da história do Oriente Médio. Agora, a passagem do Livro de Josué
poderia ajudar a esclarecer outros 500 anos de história antiga, começando pelas
cronologias hebraica e egípcia.
Fonte: msn.com
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