Como são escolhidos e definidos os nomes de objetos celestes?

 As astrônomas Duília de Mello, Ana Posses e Geisa Ponte explicam os processos que fazem com que planetas, asteroides e cometas sejam nomeados

A cratera Amaral, em Mercúrio, foi nomeada em 2008 em homenagem à artista brasileira Tarsila do Amaral (Foto: NASA/Johns Hopkins University Applied Physics Laboratory/Carnegie Institution of Washington)

Você sabia que tem uma cratera no planeta Mercúrio chamada Amaral em homenagem à grande pintora brasileira Tarsila do Amaral? E ela não é a primeira a virar nome de cratera: lá na Lua tem também a cratera Santos Dumont! Mas quem decide isso e como funciona esse processo de “batismo”? 

Bem, a decisão cabe à União Astronômica Internacional (UAI), organização sem fins lucrativos fundada em 1919, composta por cientistas profissionais, geralmente doutores, cuja pesquisa é diretamente relevante para algum ramo da astronomia. Os membros individuais são admitidos pela Comissão Executiva sob proposta de um membro nacional. Atualmente, cerca de 14 mil cientistas de 82 países, incluindo o Brasil, fazem parte da UAI, cuja sede é em Paris, na França.

A organização é composta por divisões, comissões e grupos de trabalhos organizados por áreas, como o Grupo de Trabalho para Nomenclatura do Sistema Planetário e o Grupo de Trabalho sobre Nomes de Estrelas (WGPSN e WGSN, nas siglas em inglês, respectivamente). São esses grupos que decidem as convenções para nomear corpos celestes. 

A cada três anos, os membros da UAI se reúnem em Assembleia Geral em algum dos países membros para definir políticas e aceitar novos integrantes. Foi em uma assembleias na cidade de Praga, na República Tcheca, que em 2006 se decidiu criar a classificação de planeta anão. Como resultado, Plutão deixou de ser considerado um dos nove planetas do Sistema Solar, entrando para a nova categoria.

Esse episódio foi bastante controverso na época, e ainda hoje Plutão tem um fã clube que reivindica sua reclassificação. Mas o que levou o grupo da UAI a repensar a classificação de planetas foi a descoberta de Eris, em 2005. Quando um novo corpo do Sistema Solar é descoberto, ele é classificado, e Eris, sendo quase do tamanho de Plutão, entraria como o décimo planeta. Porém, já se tinha notícias da possível existência de outros objetos como Eris habitando o Cinturão de Kuiper, de onde Plutão também faz parte.

No final, a proposta que venceu a votação na Assembleia Geral da UAI em Praga decidiu redefinir a classificação de planeta e propôs a criação da classe de planeta anão para os que não preenchessem todos os requisitos. A Duilia estava entre os membros que votaram pela mudança. No caso de Plutão, ele não preenche os requisitos de planeta porque a presença de sua lua, Caronte (1.012 km de diâmetro), que é praticamente metade do tamanho de Plutão (2.377 km de diâmetro), demonstra que durante sua formação Plutão não conseguiu limpar a órbita e continuou co-habitando a região com Caronte. 

Nomeando asteroides 

Essa nova classe de objetos do Sistema Solar tem também vários asteroides, como o gigante Ceres (952 km de diâmetro), o primeiro asteroide descoberto, em 1801, e que foi classificado como planeta durante meio século. E quem decide os nomes de asteroides, cometas e planetas anões é o Grupo de Trabalho de Nomenclatura de Pequenos Corpos (WGSBN da sigla em inglês), também da UAI. No caso de Ceres, ele ganhou um nome mitológico, que era uma prática comum da época, mas ainda utilizada por alguns observadores. 

Ao identificar um objeto ainda não catalogado, o observador repassa ao Minor Planet Center (MPC) as coordenadas do objeto utilizando o formulário com as regras e um número provisório seguindo uma fórmula do MPC. Quando o número estiver confirmado, o observador pode propor um nome para o objeto dando uma justificativa para a nomeação. Um comitê de 15 pessoas do WGSBN julga o pedido e, em no mínimo dois meses, o nome definitivo é aprovado. 

Vários astrônomos brasileiros já foram homenageados com seus nomes em asteroides, como os antigos diretores do Observatório Nacional Luiz Muniz Barreto e Ronaldo Rogério de Freitas Mourão e o diretor do Observatório do Valongo, Luis Eduardo da Silva Machado. Já em 1981, o asteroide 3602 ganhou o nome de Daniela Lazzaro, astrônoma do Observatório Nacional. E o asteroide 22454, descoberto em 1996, leva o nome da astrônoma brasileira Rosaly Lopes, radicada nos Estados Unidos.

 Tarsila do Amaral, por sua vez, não é como se chama apenas a cratera em Mercúrio, mas também a rocha espacial 4123, descoberta pelo astrônomo belga Henri Debehogne. Ele descobriu mais de 700 asteroides e era grande fã do Brasil, visitando os observatórios do país durante os anos 1970 e 1980 com frequência. No site do MPC é possível conferir várias outras homenagens ao Brasil e a brasileiros — tem asteroide chamado Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo…

E os cometas? 

Já a nomeação de cometas passa por uma subcomissão dentro da WGSBN que utiliza uma nomenclatura especial com o tipo de cometa: periódico (P/), não periódico (C/), cometa de órbita sem cálculo preciso (X/), cometa que desapareceu (D/) e interestelar (I/). 

O nome também engloba o ano em que o objeto foi identificado pela primeira vez, a quinzena do mês em que foi descoberto e a ordem na lista de descobertas. Por exemplo, o cometa C/2014 UN271 é não periódico (C/), foi descoberto em 2014, na segunda quinzena do mês de outubro (U), é o décimo terceiro do mês (N) e o 271 representa o número completo de ciclos. 

Mas hoje ele é conhecido não apenas como o maior cometa já descoberto, mas também pelo nome dos seus descobridores, Bernardinelli-Bernstein. Bernardinelli é o sobrenome do brasileiro Pedro que, junto de Gary Bernstein, seu orientador de doutorado na Universidade da Pensilvânia, identificou o objeto quando estavam analisando as imagens tiradas no observatório Cerro Tololo, no Chile. 

Para entender como funciona esse processo em relação a supernovas, vale conferir a coluna de janeiro. E a UAI adverte: ninguém pode nomear objetos celestes sem aprovação ou cobrar por nomeá-los. Mas claro que nossa imaginação está sempre a mil e você pode, sim, pensar que uma estrela tem um nome especial.

Fonte: GALILEU

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