Decifrado enigma do distanciamento entre a Terra e a Lua
Distância e idade da Lua
Por volta do ano 1880, George
Darwin - filho de Charles Darwin - postulou que a atração gravitacional da Lua
deformava a superfície da Terra, criando uma espécie de inchaço muito sutil que
não apontava diretamente para a Lua.
A atração entre essa
protuberância e nosso satélite natural atuaria como um suave freio, dissipando
parte da energia do sistema Terra-Lua e reduzindo a velocidade de rotação do
nosso planeta. Ora, como o momento angular total do sistema Terra-Lua deve ser
conservado, se a Terra gira mais lentamente, a distância entre ela e a Lua deve
aumentar.
E é isso o que de fato
acontece. Mais de um século depois da predição teórica de George, nossos
relógios atômicos e medições a laser confirmam que a Lua está se afastando do
nosso planeta em 3,83 centímetros a cada ano - quando os astronautas da missão
Artemis chegarem à Lua, eles terão que viajar cerca de dois metros a mais do
que os astronautas da Apolo.
Mas aí surge um problema:
"Quando voltamos no tempo usando o modelo de George Darwin, descobrimos
que a Lua aparentemente se formou há 1,5 bilhão de anos," explica Jacques
Laskar, do Observatório de Paris, na França. "E, no entanto, dados experimentais
mostram que a Lua tem 4,4 bilhões de anos."
Essa idade da Lua ficou
evidenciada de modo definitivo pela datação das rochas lunares trazidas pelas
missões Apolo. Ou seja, esse paradoxo intriga os cientistas desde a década de
1970.
Modelo Terra-Lua
Agora, e depois de 10 anos
trabalhando no assunto, Laskar e seus colegas acabam de elaborar um modelo do
sistema Terra-Lua que finalmente se livra do paradoxo da idade da Lua.
A discrepância entre a idade
real da Lua e aquela calculada com o modelo de maré de Darwin mostrou que este
último estava incompleto porque o coeficiente usado por Darwin para calcular a
velocidade com que a Lua está se afastando era constante.
No novo modelo, contudo, o
coeficiente é variável, como se um "pedal do freio" - a intensidade
da força de maré - tivesse sido apertado e solto alternadamente ao longo das
eras. Isso significa que a desaceleração da rotação da Terra variou
significativamente ao longo do tempo.
Não é muito difícil levantar
essa possibilidade, mas sustentá-la dependia de apontar o que aperta ou libera
o freio, ou seja, quais parâmetros determinam essas oscilações e por que e como
eles variam ao longo do tempo?
A atração gravitacional da Lua cria um bojo de maré na Terra, mas como nosso planeta não é perfeitamente elástico e está girando rapidamente, há um atraso de fase persistente entre a protuberância e a direção da Lua (o ângulo mostrado no diagrama). A protuberância produz uma força restauradora sobre a rotação da Terra, que diminui gradualmente ao longo do tempo. [Imagem: J. Laskar/Wikimedia]
Um modelo físico da Terra
com dois parâmetros
Na tentativa de definir esses
parâmetros, os pesquisadores analisaram como os oceanos absorvem a energia das
marés. Basicamente, a força que retarda a rotação da Terra é o atrito no fundo
do oceano. Como sempre acontece na construção de modelos, a equipe buscou então
uma situação simplificada, neste caso com a Terra dividida em dois hemisférios,
um oceano e um supercontinente.
À medida que voltamos no tempo
os bilhões de anos da idade da Terra, oceano e continente retrocedem como
resultado da deriva continental, fundindo-se em um oceano global nos primeiros
tempos do nosso planeta.
O resultado um tanto
surpreendente é um modelo da Terra com apenas dois parâmetros: Para descrever a
evolução da rotação da Terra, basta levar em conta a dissipação da energia das
marés no fundo do oceano e a profundidade do oceano. E as movimentações das
placas tectônicas, com a consequente reformatação dos oceanos e continentes,
explica a variação no arrasto de maré causado pela Lua.
O passo seguinte foi testar o
modelo com dados reais, para ver se as equações do modelo descreveriam realisticamente
a mudança da força de maré. Para fazer isso, a equipe se baseou em evidências
coletadas pelo geólogos. Acontece que certos depósitos sedimentares registraram
a frequência das marés em diferentes momentos da história da Terra, enquanto
outros registros geológicos indicam mudanças na orientação do eixo de rotação
da Terra, parâmetro que depende da atração gravitacional da Lua.
E o modelo "correspondeu
muito bem aos dados geológicos mais precisos," disse Laskar.
Este resultado agora permitirá
determinar a velocidade de rotação da Terra a qualquer momento desde que a Lua
se formou. Melhor ainda, também permitirá plotar em gráficos como a distância
entre nosso planeta e a Lua variou nos últimos bilhões de anos. A equipe também
está interessada em fazer os ajustes necessários ao seu modelo para aplicá-lo
aos efeitos de maré em exoplanetas.
Fonte: Inovação Tecnológica
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