Raios cósmicos não são raios - mas têm sim seu lado raio
Partículas chamadas raios se comportando como raios
No
início do século passado, o físico austríaco Victor Hess [1883-1964] descobriu
um novo fenômeno que ele batizou de raios cósmicos, que mais tarde lhe rendeu o
prêmio Nobel de Física, em 1936.
Os observatórios de raios cósmicos captam partículas secundárias que compõem o chamado "chuveiro de partículas", criado quando os raios cósmicos chocam-se com as partículas da atmosfera da Terra. [Imagem: ASPERA/G.Toma/A.Saftoiu]
Hess
conduziu voos de balão em grandes altitudes para descobrir que a atmosfera da
Terra não é ionizada pela radioatividade do solo. Em vez disso, ele confirmou
que a origem da ionização era extraterrestre.
Posteriormente,
descobriu que os raios cósmicos consistem em partículas carregadas do espaço
sideral, voando perto da velocidade da luz - ou seja, esses "raios"
não são uma radiação. No entanto, o nome "raios cósmicos" sobreviveu
a essas descobertas, embora "partículas cósmicas" fosse um nome mais
preciso.
Agora,
Mohamad Shalaby e colegas do Instituto Leibniz de Astrofísica de Potsdam, na
Alemanha, realizaram simulações numéricas para seguir as trajetórias de muitas
partículas de raios cósmicos e estudar como elas interagem com o plasma
circundante, composto por elétrons e prótons. Ao observar raios cósmicos que
voavam de um lado a outro da simulação, eles descobriram um novo fenômeno que
excita ondas eletromagnéticas no plasma de fundo. Essas ondas exercem uma força
sobre os raios cósmicos, que muda seus caminhos sinuosos.
Mais
importante ainda, este novo fenômeno pode ser melhor compreendido se
considerarmos que os raios cósmicos não se comportam como partículas
individuais, mas sim como suporte para uma onda eletromagnética coletiva. À
medida que essa onda interage com as ondas fundamentais de fundo, estas são
fortemente amplificadas, ocorrendo uma transferência de energia.
"Essa
percepção nos permite considerar os raios cósmicos como se comportando como
radiação, e não como partículas individuais neste contexto, assim como Victor
Hess acreditou originalmente," comentou o professor Christoph Pfrommer.
Simulação de raios cósmicos contrafluindo contra um plasma de fundo e excitando uma instabilidade plasmática. É mostrada a distribuição das partículas de fundo que respondem ao fluxo dos raios cósmicos no espaço de fase, que é medido pela posição da partícula (eixo horizontal) e pela velocidade (eixo vertical). [Imagem: Mohamad Shalaby et al. - 10.1017/S0022377823001289]
Compreensão de processos astrofísicos
Uma
boa analogia para esse comportamento recém-descoberto são as moléculas
individuais de água formando coletivamente uma onda que quebra na costa.
"Esse progresso só ocorreu ao considerarmos escalas menores que vinham
sendo negligenciadas, e que questionam o uso de teorias hidrodinâmicas efetivas
no estudo de processos envolvendo o plasma," explicou Shalaby.
Há
muitas aplicações dessa instabilidade do plasma, incluindo uma primeira
explicação de como os elétrons do plasma térmico interestelar podem ser
acelerados até altas energias em remanescentes de supernovas. "Esta
instabilidade do plasma recém-descoberta representa um salto significativo na
nossa compreensão do processo de aceleração, e finalmente explica porque é que
estes remanescentes de supernovas brilham no rádio e nos raios gama,"
detalhou Shalaby.
Além
disso, esta descoberta abre caminho para uma compreensão mais profunda dos
processos fundamentais do transporte de raios cósmicos nas galáxias, o que
representa o maior mistério na nossa compreensão dos processos que moldam as
galáxias durante a sua evolução cósmica.
Fonte:
Inovação Tecnológica
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