Descoberto, finalmente, o primeiro tipo de molécula do univero
Ilustração da nebulosa planetária NGC 7027 e das moléculas de hidreto de hélio. Nesta nebulosa planetária, o SOFIA detetou hidreto de hélio, uma combinação de hélio (vermelho) e hidrogénio (azul), que foi o primeiro tipo de molécula a formar-se no Universo primitivo. Esta é a primeira vez que o hidreto de hélio foi descoberto no Universo moderno.Crédito: NASA/SOFIA/L. Proudfit/D.Rutter
O primeiro tipo de molécula
que se formou no Universo foi detetado no espaço pela primeira vez, após década
de pesquisa. Os cientistas descobriram a sua assinatura na nossa própria
Galáxia usando o maior observatório aerotransportado do mundo, o SOFIA (Stratospheric
Observatory for Infrared Astronomy) da NASA, enquanto o avião voava bem acima
da superfície da Terra e apontava os seus instrumentos sensíveis para o cosmos.
Quando o Universo era ainda
muito jovem, só existiam apenas alguns tipos de átomos. Os cientistas pensam
que cerca de 100.000 anos após o Big Bang, o hélio e o hidrogénio combinaram-se
para fazer pela primeira vez uma molécula chamada hidreto de hélio. O hidreto
de hélio deve estar presente em algumas partes do Universo moderno, mas nunca
tinha sido detetado no espaço - até agora.
O SOFIA encontrou o hidreto
de hélio moderno numa nebulosa planetária, um remanescente do que já foi uma
estrela parecida com o Sol. Localizada a 3000 anos-luz de distância na direção
da constelação de Cisne, esta nebulosa planetária, de nome NGC 7027, tem
condições que permitem a formação desta molécula misteriosa. A descoberta serve
como prova de que o hidreto de hélio pode, de facto, existir no espaço. Isto
confirma uma parte fundamental da nossa compreensão básica da química do
Universo primitivo e de como evoluiu ao longo de milhares de milhões de anos
para a química complexa de hoje. Os resultados foram publicados na edição desta
semana da revista Nature.
"Esta molécula estava à
espreita, mas precisávamos dos instrumentos certos para fazer as observações na
posição certa - e o SOFIA conseguiu fazer isso perfeitamente," disse
Harold Yorke, diretor do Centro de Ciência SOFIA, em Silicon Valley, no estado
norte-americano da Califórnia.
Hoje, o Universo está cheio
de estruturas grandes e complexas como planetas, estrelas e galáxias. Mas há
mais de 13 mil milhões de anos, após o Big Bang, o Universo primordial era
quente e tudo o que existia eram alguns tipos de átomos, principalmente hélio e
hidrogénio. À medida que os átomos se combinavam para formar as primeiras
moléculas, o Universo foi finalmente capaz de arrefecer e começou a tomar
forma. Os cientistas inferiram que o hidreto de hélio era essa primeira
molécula primordial.
Quando o arrefecimento
começou, os átomos de hidrogénio puderam interagir com o hidreto de hélio,
levando à criação do hidrogénio molecular - a molécula principalmente
responsável pela formação das primeiras estrelas. As estrelas passaram a forjar
todos os elementos que compõem o nosso rico cosmos químico de hoje. O problema,
porém, é que os cientistas não conseguiam encontrar hidreto de hélio no espaço.
Este primeiro passo no nascimento da química permaneceu por provar, até agora.
"A falta de evidências
da própria existência do hidreto de hélio no espaço interestelar foi um dilema
para a astronomia durante décadas," disse Rolf Guesten do Instituto Max
Planck para Radioastronomia, em Bona, Alemanha, autor principal do artigo.
O hidreto de hélio é uma
molécula "sensível". O hélio, propriamente dito, é um gás nobre que
dificilmente combina com qualquer outro tipo de átomo. Mas em 1925 os
cientistas conseguiram criar a molécula em laboratório, persuadindo o hélio a
partilhar um dos seus eletrões com um ião de hidrogénio.
Seguidamente, no final da
década de 1970, os cientistas que estudavam a nebulosa planetária NGC 7027
pensaram que este ambiente podia ser o ideal para formar o hidreto de hélio. A
radiação ultravioleta e o calor da estrela envelhecida criam condições
adequadas para a formação do hidreto de hélio. Mas as suas observações foram
inconclusivas. Esforços subsequentes sugeriram que podia lá existir, mas a
molécula misteriosa continuava a escapar à deteção. Os telescópios espaciais
usados não tinham a tecnologia específica para captar o sinal do hidreto de
hélio a partir da mistura de outras moléculas na nebulosa.
Em 2016, os cientistas
recorreram à ajuda do SOFIA. Voando a mais de 13.000 metros de altitude, o
SOFIA faz observações acima das camadas interferentes da atmosfera da Terra.
Mas tem uma vantagem em relação aos telescópios espaciais - regressa ao solo
depois de cada voo.
"Podemos mudar os
instrumentos e instalar a tecnologia mais recente," disse Naseem Rangwala,
cientista do projeto SOFIA. "Esta flexibilidade permite-nos melhorar as
observações e responder às questões mais prementes dos cientistas."
Uma atualização recente de um
dos instrumentos do SOFIA, chamado GREAT (German Receiver at Terahertz
Frequencies), acrescentou o canal específico para o hidreto de hélio que os
telescópios anteriores não tinham. O instrumento trabalha como um recetor de
rádio. Os cientistas sintonizam a frequência da molécula que procuram, de modo
semelhante à sintonização de um rádio FM na estação certa. Quando o SOFIA
levantou voo no céu noturno, os ansiosos cientistas estavam a bordo lendo os
dados do instrumento em tempo real. O sinal do hidreto de hélio finalmente foi
recebido em condições.
"Foi muito emocionante
estar lá e ver o hidreto de hélio pela primeira vez nos dados," disse
Guesten. "Isto leva uma investigação longa a um final feliz e elimina
dúvidas sobre a nossa compreensão da química subjacente do Universo
primordial."
Fonte: Astronomia OnLine
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