Investigando o mistério da migração dos "Júpiteres quentes"

A atmosfera turbulenta de um planeta quente e gasoso conhecido como HD 80606b, uma simulação que tem por base dados do Telescópio Espacial Spitzer da NASA. Crédito: NASA/JPL-Caltech


Na última década assistimos a muitas descobertas exoplanetárias. Já foram confirmados, até agora, quase 2000 exoplanetas - planetas fora do nosso Sistema Solar - e mais de 5000 candidatos a exoplaneta foram identificados. Muitos destes mundos exóticos pertencem a uma classe conhecida como "Júpiteres quentes". Estes são gigantes gasosos como Júpiter, mas muito mais quentes, com órbitas que os levam muito perto das suas estrelas. Ao início, os Júpiteres quentes eram considerados raros, uma vez que não temos nada do género no nosso próprio Sistema Solar. Mas à medida que iam sendo encontrados cada vez mais, além de muitos outros planetas mais pequenos que orbitam muito perto das suas estrelas, o nosso Sistema Solar começou a parecer o verdadeiro "desajustado".

"Nós pensávamos que o nosso Sistema Solar era normal, mas não é o caso," afirma Greg Laughlin, astrónomo da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, EUA, coautor de um novo estudo do Telescópio Espacial Spitzer da NASA que investiga a formação dos Júpiteres quentes. Por mais comuns que os Júpiteres quentes sejam agora, ainda estão envoltos em mistério. Como é que estes globos gigantescos se formam e como é que acabam incrivelmente tão perto das suas estrelas?

O telescópio Spitzer descobriu novas pistas, observando um Júpiter quente conhecido como HD 80606b, situado a 190 anos-luz da Terra. Este planeta é invulgar no sentido que tem uma órbita altamente excêntrica, quase como a de um cometa, balançando-se muito perto da sua estrela e depois afastando-se a distâncias muito maiores a cada 111 dias. Pensa-se que um lado do planeta é dramaticamente mais quente do que o outro durante as suas angustiantes aproximações. Na verdade, quando o planeta está mais próximo da estrela hospedeira, o lado voltado na sua direção aquece rapidamente até aos 1100 graus Celsius.

"À medida que o planeta se aproxima da estrela, sente uma explosão de luz estelar, ou radiação. A atmosfera torna-se um caldeirão de reações químicas e os ventos superam a velocidade dos furacões," afirma Laughlin, cujo artigo do Spitzer foi aceite para publicação na revista The Astrophysical Journal. Pensa-se que HD 80606b esteja no processo de migrar de uma órbita mais distante até uma órbita muito mais íntima, típica dos Júpiteres quentes. Uma das principais teorias da formação de Júpiteres quentes afirma que os gigantes gasosos em órbitas distantes se tornam Júpiteres quentes quando as influências gravitacionais de estrelas ou planetas vizinhos os empurram para órbitas mais próximas. Os planetas começam em órbitas excêntricas e, ao longo de um período de centenas de milhões de anos, pensa-se que gradualmente assentem em órbitas apertadas e circulares.

"Pensa-se que este planeta foi apanhado no acto de migrar para o interior," comenta Julien de Wit do Instituto de Tecnologia do Massachusetts, em Cambridge, EUA, autor principal do novo trabalho. "Ao estudar este exoplaneta, podemos testar teorias sobre a formação dos Júpiteres quentes. O Spitzer estudou HD 80606b anteriormente em 2009. As observações mais recentes são mais detalhadas, graças a um maior tempo de observação - 85 horas - e a melhorias na sensibilidade do Spitzer no que respeita a exoplanetas. Os dados do Spitzer são pristinos," comenta de Wit. "E fomos capazes de observar o planeta desta vez durante muito mais tempo, o que nos dá mais detalhes sobre a sua temperatura mais fria e quão rápido ele aquece, arrefece e gira."

Uma questão fundamental abordada no novo estudo é: quanto tempo é que HD 80606b leva para migrar de uma órbita excêntrica para uma órbita circular? Uma forma de avaliar isto é olhar para quão "mole" é o planeta. Quando HD 80606b passa perto da sua estrela, a gravidade espreme-o. Caso o planeta seja mais mole, ou mais flexível, poderá melhor dissipar esta energia gravitacional sob a forma de calor. E quanto mais calor é dissipado, mais depressa o planeta fará a transição para uma órbita circular, um processo conhecido como circularização.

"Se pegarmos numa pequena bola tipo-esponja e a apertarmos muitas vezes muito depressa, vemos que ela aquece," afirma Laughlin. "Isto porque esta bola é muito boa a transferir energia mecânica em calor. É mole como resultado. Os dados do Spitzer mostram que HD 80606b não dissipa muito calor quando é espremido pela gravidade durante os seus encontros próximos - e, portanto, não é mole, mas em vez disso mais duro como um todo. Isto sugere que o planeta não está a circularizar a sua órbita tão depressa quanto o esperado e que poderá demorar outros 10 mil milhões de anos, ou mais, para concluir a transição. Estamos começando a aprender quanto tempo demora a ocorrer a migração dos Júpiteres quentes," observa de Wit. "As nossas teorias diziam que não devia demorar assim tanto tempo porque não vemos a migração de Júpiteres quentes com muita frequência."

"As escalas longas de tempo que estamos a observar aqui sugerem que um mecanismo de migração poderá não ser tão eficiente para a formação de Júpiteres quentes quanto pensávamos," comenta Laughlin. O estudo do Spitzer sugere que as teorias concorrentes para a formação dos Júpiteres quentes - nas quais os gigantes gasosos se formam "in situ", ou perto das suas estrelas, ou que suavemente espiralam para dentro com a ajuda de discos de formação planetária - podem ser preferidas.

O novo estudo é também o primeiro a medir a rotação de um exoplaneta em órbita de uma estrela parecida com o Sol. O Spitzer observou mudanças no brilho do planeta à medida que este gira sob o seu próprio eixo, estabelecendo um período de rotação de 90 horas. "Há cinquenta anos atrás estávamos, pela primeira vez, a medir a rotação dos planetas no nosso próprio Sistema Solar. Agora estamos a fazer o mesmo para planetas que orbitam outras estrelas. É bastante surpreendente," comenta Laughlin. A rotação de 90 horas é muito mais lenta do que o previsto para HD 80606b, o que intriga os astrónomos e acrescenta à duradoura mística dos Júpiteres quentes.
Fonte: Astronomia Online

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