Bombardeio de estrela por cometas pode ser uma repetição do nascimento do Sistema Solar
Muito além do nosso Sol,
bombardeio afeta jovem estrela do tipo solar - e possivelmente seus planetas
internos
Concepção artística ilustrando uma tempestade de cometas em torno de Eta Corvi, uma jovem estrela a cerca de 59 anos-luz de distância do nosso Sistema Solar.
Uma chuva de cometas está
caindo sobre uma jovem estrela distante, dando aos astrônomos uma nova visão de
um processo que moldou nosso Sistema Solar bilhões de anos atrás. Quando a Terra era um planeta
jovem, detritos de cometas atingiam sua superfície, transportando material
orgânico que pode ter ajudado a vida a surgir em nosso mundo rochoso. Nos
últimos anos, cientistas identificaram evidências indiretas de um processo
semelhante em torno de Eta Corvi, uma estrela do tipo solar a cerca de 59
anos-luz de distância, que é um pouco maior e três vezes mais jovem do que o
nosso próprio Sol.
Agora, os lampejos de gás recém-observados, os quais
cientistas acreditam que emanam de cometas evaporando no calor da estrela,
estão fornecendo evidências mais fortes tanto da existência de planetas ocultos
quanto da ocorrência de impactos cataclísmicos.
Detectadas pelo astrônomo
Barry Welsh, da Universidade da Califórnia em Berkeley, e por sua colega Sharon
Montgomery, da Clarion University, na Pensilvânia, essas lufadas de gás podem
ter uma conexão profunda, embora indireta, com nosso próprio lar cósmico.
Quando nosso Sol tinha a mesma idade de Eta Corvi, a maioria dos teóricos
acredita que as interações gravitacionais entre os planetas externos do nosso
Sistema Solar varreram para a parte interna os remanescentes gelados de sua
formação, ocasionando um bombardeio que devassou a Terra e outros planetas
rochosos.
Este "bombardeio cósmico tardio" (LHB, na sigla em inglês)
pode ter sido crucial para a habitabilidade da Terra e para nossa própria
existência, ao trazer, do armazenamento profundo nas regiões frias do Sistema
Solar externo, os compostos orgânicos e água, elementos essenciais para a vida.
E algo parecido com isso parece estar ocorrendo agora em torno de Eta Corvi.
Welsh chama a estrela de "potencial Sistema Solar em formação".
Quando visto em conjunto com
observações anteriores que também sugerem influxos de fragmentos de gelo e
colisões que abalam o planeta em torno de Eta Corvi, o trabalho de Welsh e de
Montgomery constitui o melhor caso para um bombardeio de cometas em curso em
torno de outra estrela. O influxo em si fornece dicas sobre planetas envoltos
em dois anéis maciços.
Acredita-se que uma cadeia de planetas gigantes esteja
jogando os cometas para dentro, enquanto pelo menos um corpo rochoso parece ter
sido atingido pelos destroços gelados. "Temos uma boa imagem dos diferentes
fenômenos que estão ocorrendo no sistema e agora temos uma maneira de
conectá-los", diz Sebastian Marino, astrônomo da Universidade de Cambridge
que utilizou o Atacama Large Millimeter / submillimeter Array in Chile para
estudar Eta Corvi. Marino não estava envolvido com os novos resultados.
PROVA DO PASSADO
Com 1,5 bilhão de anos de
idade, Eta Corvi e seu disco já passaram bastante da infância do planeta. Como
o nosso próprio Sistema Solar, a estrela possui um par de discos de detritos,
embora Eta Corvi esteja um pouco mais distante. Os discos interno e externo
estão a seis e 165 unidades astronômicas (UAs) da estrela, respectivamente
(onde uma UA é igual à distância entre a Terra e o Sol).
Em comparação, nosso
Cinturão de Asteróides fica a cinco UAs do Sol, enquanto o Cinturão de Kuiper -
os restos de gelo que sobraram da formação do Sistema Solar - começa apenas com
40 UAs. O fato de Eta Corvi brilhar mais e ser mais quente do que o nosso
próprio Sol faz com que os cintos sejam parecidos com os nossos.
A existência de cometas em
torno de Eta Corvi não é inesperada. Em 2012, uma equipe de astrônomos liderada
por Carey Lisse, no Laboratório de Física Aplicada da Universidade Johns
Hopkins, descobriu material incomum no cinturão interno. Usando o Telescópio
Espacial Spitzer da NASA, eles descobriram que nanolosangos microscópicos,
juntamente com poeira rica em água e carbono, foram misturados ao cinturão
interno.
Os pesquisadores concluíram que algum material vindo de fora do
cinturão mais externo havia entrado no sistema, provavelmente através de pelo
menos um grande cometa, e que a pura força de sua colisão com um planeta
rochoso invisível esmagou a rocha rica em carbono e transformou-a em pó de
diamante, que então salpicava o cinturão interno.
Trabalhos posteriores de
Marino sugeriram que uma cadeia de planetas de tamanho médio, maiores do que a
Terra, mas menores do que Júpiter, poderiam arremessar material cometário para
dentro da região do cinturão externo, numa espécie de jogo celestial de batata quente. Nesse
cenário, a atração gravitacional do planeta mais externo retira o material do
cinturão externo e o transporta até que a gravidade do próximo planeta o
afaste. Os cometas congelados continuam a se mover, de um planeta para outro,
até chegarem ao cinturão interno, onde a luz do sol derrete suas camadas
externas e cria suas “caudas” distintivas de poeira e gás.
As novas observações fazem um
caso ainda mais forte para os cometas migrantes. Welsh e Montgomery usaram um
telescópio de 2,1 metros na Universidade do Texas, no Observatório McDonald de
Austin, para estudar Eta Corvi em quatro noites. Durante uma das sessões de uma
hora da equipe, eles viram gás quente, que saía de um objeto grande, ou de um
enxame de objetos menores, bloqueando a luz da estrela.
Métodos semelhantes
foram usados para identificar cometas em torno de outras estrelas. "O que
vemos é equivalente a quando vemos um cometa no Sistema Solar", diz Isabel
Rebollido, aluna de doutorado da Universidade Autônoma de Madri, que caça
exocometas em volta de estrelas jovens e estudou o sistema Eta Corvi.
As novas observações poderiam
ajudar a melhorar nossa compreensão do que aconteceu em nosso próprio Sistema
Solar quando o Sol tinha a mesma idade que Eta Corvi tem hoje. "Se você olhar
para o nosso próprio Sistema Solar, as pessoas estão discutindo sobre o
bombardeio intenso", diz Lisse. Ele acrescenta que há um grande debate
sobre se esse evento memorável na história do Sistema Solar ocorreu como um
único grande pico ou, em vez disso, a Terra e os outros planetas terrestres
experimentaram um ataque mais lento e gradual.
Se Eta Corvi é verdadeiramente
um análogo confiável para o Sistema Solar, ele diz, pode nos ajudar a conter as
incertezas sobre o tempo e a magnitude da LHB - o que, por sua vez, poderia
melhorar nossa compreensão desse processo à medida que ele se desdobra em
outras estrelas. "É isso que realmente gostaríamos de aprender", diz
ele.
ESPERANÇA PARA O FUTURO
Até agora, nenhum planeta foi
confirmado orbitando Eta Corvi, mas a evidência indireta de sua existência é
forte. Enquanto os limites exatos do Cinturão de Kuiper do nosso Sistema Solar
são um tanto nebulosos e difusos, o cinturão externo de Eta Corvi é estreito e
melhor definido. De acordo com David Nesvorny, um teórico do Southwest Research
Institute que modela o desenvolvimento inicial do nosso Sistema Solar, um
estreito cinturão sugere fortemente a presença de pelo menos um gigante gasoso
nos arredores da faixa.
Tampouco as cadeias de
planetas são incomuns. A multiplicidade é a norma para os sistemas
exoplanetários, e quase todo tipo de sistema multiplanetário deve prontamente
lançar material para a região interna. Atualmente, a maioria das técnicas de
detecção de exoplanetas funciona melhor para encontrar mundos próximos de suas
estrelas, mas Nesvorny diz que não ficaria surpreso ao descobrir que cadeias de
planetas se estendem para os limites externos de sistemas planetários
alienígenas. Os planetas exteriores do Sistema Solar criam essa corrente,
embora a gravidade massiva de Júpiter, na maioria das vezes, ejete material
para o espaço interestelar, em vez de transportá-lo para mais perto do Sol.
Welsh e Montgomery planejam
continuar observando Eta Corvi para fornecer mais uma confirmação do tentador
sinal do cometa. Lisse diz que uma nova geração de grandes telescópios
terrestres e espaciais programados para começar as operações na próxima década
podem ser capazes de fazer imagens do anel interno para ver mais claramente o
que está acontecendo lá - talvez até revelando os planetas ocultos da estrela.
Enquanto isso, Lisse e seus colegas usaram os telescópios espaciais da NASA
Chandra e Spitzer para monitorar a estrela, descartando mundos supermassivos
cinco a dez vezes maiores que Júpiter; outras observações estabeleceram um
limite superior de seis massas de Júpiter em quaisquer planetas ao redor de Eta
Corvi. Pode ser apenas uma questão de tempo até que os astrônomos realmente
enxerguem a multiplicidade de mundos de tamanho médio que deve se esconder por
ali, e obtenham deles um vislumbre mais profundo de um dos capítulos mais
violentos da história do nosso Sistema Solar.
Fonte: Scientific American Brasil
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