Mapeamento de "ECOS DE LUZ" de buraco negro recém - descoberto
Nesta ilustração de um recém-descoberto buraco negro de nome
MAXI J1820+070, o objeto exótico atrai matéria de uma estrela companheira para
um disco de acreção. Por cima do disco encontra-se uma região de partículas
subatómicas chamada coroa. Crédito: Aurore Simonnet e Centro de Voo Espacial
Goddard da NASA
Cientistas mapearam o
ambiente em torno de um buraco negro de massa estelar com 10 vezes a massa do
Sol usando o NICER (Neutron star Interior Composition Explorer) da NASA a bordo
da Estação Espacial Internacional. O NICER detetou raios-X do recém-descoberto
buraco negro MAXI J1820+070 (ou J1820), à medida que consumia material de uma
estrela companheira. Ondas de raios-X formaram "ecos de luz" refletidos
do turbilhão de gás perto do buraco negro e revelaram mudanças no tamanho e na
forma do ambiente.
"O NICER permitiu-nos
medir os ecos de luz mais próximos, até agora, de um buraco negro de massa
estelar," disse Erin Kara, astrofísica da Universidade de Maryland em
College Park e do Centro de Voo Espacial Goddard no mesmo estado
norte-americano, que apresentou os seus achados na 233.ª reunião da Sociedade
Astronómica Americana em Seattle. "Anteriormente, esses ecos de luz do
disco interior de acreção tinham sido vistos apenas em buracos negros
supermassivos, que têm milhões a milhares de milhões de vezes a massa do Sol e
que mudam muito lentamente. Os buracos negros de massa estelar como J1820 têm
massas muito menores e evoluem muito mais depressa, de modo que podemos ver
mudanças a ocorrer em escalas de tempo humanas."
O artigo que descreve as
descobertas, liderado por Kara, foi publicado na edição de 10 de janeiro da
revista Nature e está disponível online.
J1820 está localizado a
aproximadamente 10.000 anos-luz na direção da constelação de Leão. A estrela
companheira no sistema foi identificada num levantamento realizado pela missão
Gaia da ESA, que permitiu que os cientistas estimassem a sua distância. Os
astrónomos só souberam da presença do buraco negro no dia 11 de março de 2018,
quando foi detetada uma explosão pelo MAXI (Monitor of All-sky X-ray Image) da
JAXA (a agência espacial japonesa), também a bordo da ISS. J1820 passou de um
buraco negro totalmente desconhecido para uma das fontes mais brilhantes do céu
de raios-X ao longo de alguns dias. O NICER foi rapidamente apontado para esta
transição dramática e continua a seguir o rescaldo da erupção.
"O NICER foi desenhado
para ser suficientemente sensível para estudar objetos fracos e incrivelmente
densos chamados estrelas de neutrões," disse Zaven Arzoumanian, chefe
científico do NICER em Goddard e coautor do artigo. "Estamos satisfeitos
com quão útil provou ser também no estudo destes buracos negros de massa
estelar que brilham em raios-X."
Um buraco negro pode sugar
gás de uma estrela companheira próxima para um anel de material chamado disco
de acreção. As forças gravitacionais e magnéticas aquecem o disco a milhões de
graus, tornando-o quente o suficiente para produzir raios-X nas regiões mais
internas do disco, perto do buraco negro. As explosões ocorrem quando uma
instabilidade no disco provoca uma inundação de gás para o interior, na direção
do buraco negro, como uma avalanche. Os motivos das instabilidades de disco não
são bem compreendidos.
Acima do disco está a coroa,
uma região de partículas subatómicas com mais ou menos mil milhões de graus
Celsius que brilha em raios-X altamente energéticos. Ainda permanecem muitos
mistérios sobre a origem e evolução da coroa. Algumas teorias sugerem que a
estrutura poderá representar uma forma inicial dos jatos de partículas velozes
que esses tipos de sistemas geralmente emitem.
Os astrofísicos querem
entender melhor como a orla interna do disco de acreção e a coroa, por cima,
mudam de tamanho e forma à medida que um buraco negro acreta material da sua
estrela companheira. Se se conseguir entender como e porque é que estas
mudanças ocorrem nos buracos negros de massa estelar ao longo de um período de
semanas, os cientistas podem lançar luz sobre a evolução dos buracos negros
supermassivos ao longo de milhões de anos e como afetam as galáxias em que
residem.
Um dos métodos usados para
estudar estas mudanças tem o nome mapeamento de reverberação de raios-X, que
usa reflexos de raios-X da mesma maneira que um sonar usa ondas sonoras para
mapear terreno submarino. Alguns raios-X da coroa viajam diretamente até nós,
enquanto outros iluminam o disco e são refletidos de volta a energias e ângulos
diferentes.
O mapeamento de reverberação
de raios-X dos buracos negros supermassivos mostrou que a orla interna do disco
de acreção está muito próxima do horizonte de eventos, o ponto de não retorno.
A coroa também é compacta, ficando mais próxima do buraco negro do que grande
parte do disco de acreção. Observações anteriores de ecos de raios-X de buracos
negros estelares, no entanto, sugeriram que a secção interior do disco de
acreção podia estar bem distante, até centenas de vezes o tamanho do horizonte
de eventos. No entanto, o buraco negro de massa estelar J1820 tem um
comportamento mais parecido com o dos seus primos supermassivos.
À medida que examinava as
observações de J1820 pelo NICER, a equipa viu uma diminuição no atraso de tempo
entre o clarão inicial de raios-X oriundos diretamente da coroa e o seu eco do
disco, indicando que os raios-X viajaram cada vez menos antes de serem
refletidos. A 10.000 anos-luz de distância, estimaram que a coroa se contraiu
verticalmente de aproximadamente 161 km para 16,1 km - o correspondente a ver
algo do tamanho de um mirtilo a encolher para algo com o tamanho de uma semente
de papoila à distância de Plutão.
"Esta é a primeira vez
que vemos este tipo de evidência da diminuição da coroa durante esta fase
particular da evolução de uma erupção," salientou o coautor Jack Steiner,
astrofísico do Instituto Kavli para Astrofísica e Investigação Espacial do MIT
(Massachusetts Institute of Technology) em Cambridge. "A coroa ainda é
bastante misteriosa e ainda temos uma compreensão fraca do que é. Mas agora
temos evidências de que o que está a evoluir no sistema é a estrutura da
própria coroa."
Para confirmar que a
diminuição no tempo de atraso era provocada por uma mudança na coroa e não no
disco, os cientistas usaram um sinal chamado linha K de ferro, produzido quando
os raios-X da coroa colidem com átomos de ferro no disco, dotando-os de
fluorescência. O tempo corre mais devagar em campos gravitacionais mais fortes
e a velocidades mais altas, como indicado pela teoria da relatividade de
Einstein. Quando os átomos de ferro mais próximos do buraco negro são
bombardeados pela luz do núcleo da coroa, os comprimentos de onda de raios-X
que emitem são esticados porque o tempo move-se mais lentamente para eles do
que para o observador (neste caso, o NICER).
A equipa de Kara descobriu
que a linha K de ferro esticada de J1820 permaneceu constante, o que significa
que a orla interna do disco permaneceu perto do buraco negro - semelhante a um
buraco negro supermassivo. Se o menor tempo de atraso fosse provocado por uma
região interna do disco movendo-se ainda mais para dentro, então a linha K de
ferro teria sido esticada ainda mais.
Estas observações fornecem
aos cientistas novas informações sobre como o material é afunilado para o
buraco negro e como a energia é libertada neste processo.
"As observações de J1820
pelo NICER ensinaram-nos algo novo sobre os buracos negros de massa estelar e
sobre como podemos usá-los como análogos para o estudo dos buracos negros
supermassivos e dos seus efeitos na formação de galáxias," disse o coautor
Philip Uttley, astrofísico da Universidade de Amesterdão. "Já assistimos a
quatro eventos parecidos no primeiro ano do NICER e é impressionante. Parece
que estamos à beira de um enorme avanço na astronomia de raios-X."
Fonte: Astronomia OnLine
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