Pulsos raios gama de estrela de nêutrons que gira muito rápido
Um pulsar e a sua pequena companheira estelar, vistas no seu plano orbital. A poderosa radiação e o "vento" pulsar - um fluxo de partículas altamente energéticas - aquecem fortemente o lado da estrela orientado na direção do pulsar até temperaturas duas vezes mais altas do que a superfície do Sol. O pulsar está a evaporar gradualmente a sua parceira, que enche o sistema com gás ionizado e impede os astrónomos de detetarem, na maior parte do tempo, o feixe rádio do pulsar.Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA/Cruz deWilde
Uma equipe internacional de
investigação liderada pelo Instituto Max Planck para Física Gravitacional
(Instituto Albert Einstein em Hannover) descobriu que o pulsar de rádio
J0952-0607 também emite radiação gama pulsada. J0952-0607 gira 707 vezes por
segundo e é o segundo na lista de estrelas de neutrões de rápida rotação.
Através da análise de 8,5
anos de dados do Telescópio Espacial de Raios Gama Fermi da NASA, observações
de rádio do LOFAR dos últimos dois anos, observações de dois grandes
telescópios óticos, e dados de ondas gravitacionais dos detetores LIGO, a
equipa usou uma abordagem variada para estudar em detalhe o sistema binário do
pulsar e da sua companheira leve.
O estudo publicado na revista The
Astrophysical Journal mostra que os sistemas pulsares extremos estão escondidos
nos catálogos Fermi e motiva investigações adicionais. Apesar de muito extensa,
a análise também levanta novas questões não respondidas sobre este sistema.
Os pulsares são os restos
compactos de explosões estelares que possuem fortes campos magnéticos e que
giram muito depressa. Emitem radiação como um farol cósmico e podem ser
observados como pulsares de rádio e/ou pulsares de raios gama, dependendo da
sua orientação para a Terra.
O
pulsar mais rápido fora dos enxames globulares
PSR J0952-0607 (o nome indica
a posição no céu) foi descoberto pela primeira vez em 2017 por observações de
rádio de uma fonte identificada pelo Telescópio Espacial de Raios Gama Fermi
como possivelmente um pulsar. Não foram detetadas pulsações de raios gama nos
dados do LAT (Large Area Telescope) a bordo do Fermi. Observações com os
radiotelescópios LOFAR identificaram uma fonte de rádio pulsante e - juntamente
com as observações por telescópios óticos - permitiram medir algumas
propriedades do pulsar. Está a orbitar o centro de massa comum em 6,2 horas com
uma estrela companheira que tem apenas 1/50 da massa do nosso Sol. O pulsar
gira 707 vezes por segundo e é, portanto, a mais rápida rotação na nossa
Galáxia para lá dos densos ambientes dos enxames globulares.
Procurando
sinais extremamente fracos
Usando estas informações
anteriores do sistema binário, Lars Nieder, estudante de doutoramento no
Instituto Albert Einstein em Hannover, decidiu verificar se o pulsar também
emitia raios gama pulsados. "Esta investigação é extremamente desafiadora
porque o Telescópio de Raios Gama Fermi apenas registou o equivalente a cerca
de 200 raios gama oriundos do pulsar fraco nos seus 8,5 anos de observações.
Durante este período, o próprio pulsar girou 220 mil milhões de vezes. Por
outras palavras, apenas foi observado um raio gama a cada mil milhões de
rotações!", explicou Nieder. "Para cada um destes raios gama, a
pesquisa deve identificar exatamente quando e qual das rotações de 1,4
milissegundos o emitiu."
Isto requer vasculhar os
dados com uma resolução muito fina para não perder nenhum sinal possível. O
poder de computação necessário é enorme. A busca muito sensível por pulsações
leves de raios gama levaria 24 anos a ser concluída num único núcleo de
computador. Ao usarem o complexo computacional do Instituto Albert Einstein em
Hannover, terminaram em apenas 2 dias.
Uma
estranha primeira deteção
"A nossa pesquisa
encontrou um sinal, mas algo estava errado! O sinal era muito fraco e não
estava exatamente onde deveria estar. A razão: a nossa deteção de raios gama de
J0952-0607 havia revelado um erro de posição nas observações iniciais do
telescópio ótico que usámos para direcionar a nossa análise. A nossa descoberta
das pulsações de raios gama revelou este erro," explica Nieder. "Este
erro foi corrigido na publicação que relatou a descoberta do pulsar de rádio.
Uma nova e extensa pesquisa de raios gama fez uma descoberta bastante fraca -
mas estatisticamente significativa - de pulsar de raios gama na posição
corrigida."
Tendo descoberto e confirmado
a existência da radiação gama pulsada do pulsar, a equipa voltou aos dados do
Fermi e usou os 8,5 anos completos de agosto de 2008 a janeiro de 2017 para
determinar os parâmetros físicos do pulsar e do seu sistema binário. Dado que a
radiação gama de J0952-0607 era muito fraca, tiveram que aprimorar o seu método
de análise desenvolvido anteriormente para incluir corretamente todas as
incógnitas.
Outra
surpresa: sem pulsos gama até julho de 2011
A solução derivada continha
outra surpresa, porque era impossível detetar pulsos de raios gama da estrela
de neutrões nos dados anteriores a julho de 2011. A razão pela qual o pulsar
parece apenas mostrar pulsos após essa data é desconhecida. As variações na
quantidade de raios gama emitidos podem ser uma razão, mas o pulsar é tão ténue
que não foi possível testar esta hipótese com precisão suficiente. Alterações
na órbita do pulsar, vistas em sistemas similares, também podem fornecer uma
explicação, mas não havia sequer uma pista nos dados de que isso estava a
acontecer.
Observações
óticas levantam outras questões
A equipe também usou
observações com o NTT (New Technology Telescope) do ESO em La Silla e com o GTC
(Gran Telescopio Canarias) em La Palma para examinar a estrela companheira do
pulsar. Muito provavelmente tem bloqueio de marés em relação ao pulsar, como a
Lua em relação à Terra, de modo que um lado está sempre virado para o pulsar e
é aquecido pela sua radiação. Embora a estrela companheira orbite o sistema de
massa do binário, o seu lado "diurno" mais quente e o seu lado
"noturno" mais frio são visíveis da Terra e o brilho e a cor
observada variam.
Estas observações criam outro
enigma. Embora as observações rádio apontem para uma distância de
aproximadamente 4400 anos-luz, as observações óticas implicam uma distância
cerca de três vezes maior. Se o sistema estivesse relativamente próximo da
Terra, apresentaria uma companheira extremamente compacta e densa, nunca antes
vista, enquanto as distâncias maiores são compatíveis com as densidades de
companheiras pulsares semelhantes conhecidas. Uma explicação para esta
discrepância pode ser a existência de ondas de choque no vento de partículas do
pulsar, que podem levar a um aquecimento diferente da companheira. Mais
observações de raios gama com o LAT do Fermi devem ajudar a responder a esta
pergunta.
À
procura de ondas gravitacionais contínuas
Outro grupo de investigadores
do Instituto Albert Einstein em Hannover procurou a emissão contínua de ondas
gravitacionais do pulsar usando dados da primeira (O1) e da segunda (O2)
campanhas de observação do LIGO. Os pulsares podem emitir ondas gravitacionais
quando possuem pequenas "colinas" ou "inchaços" à sua
superfície. A investigação não detetou ondas gravitacionais, o que significa
que a forma do pulsar deve estar muito próxima de uma esfera perfeita, com as
maiores deformações não excedendo frações de um milímetro.
Estrelas
de neutrões em rápida rotação
A compreensão dos pulsares em
rápida rotação é importante porque são sondas da física extrema. A rapidez com
que as estrelas de neutrões podem girar antes de se separarem devido às forças
centrífugas é desconhecida e depende de física nuclear desconhecida. Os
pulsares de milissegundo como J0952-0607 giram tão depressa porque foram
acelerados pela acreção de matéria da sua companheira. Pensa-se que este
processo enterre o campo magnético do pulsar. Com observações de raios gama a
longo prazo, a equipa de investigação mostrou que J0952-0607 possui um dos dez
campos magnéticos mais baixos já medidos para um pulsar, consistente com as
expetativas teóricas.
Einstein@Home procura casos
de estudo de física extrema
"Vamos continuar a
estudar este sistema com observatórios de raios gama, rádio e óticos, pois
ainda há perguntas sem resposta. Esta descoberta também mostra mais uma vez que
os sistemas pulsares extremos estão escondidos no catálogo LAT do Fermi," diz
o professor Bruce Allen, supervisor do doutoramento de Nieder e Diretor do
Instituto Albert Einstein em Hannover. "Também estamos a utilizar o nosso
projeto de computação distribuída de ciência cidadã, Einstein@Home, para
procurar sistemas binários com pulsares de raios gama noutras fontes do LAT do
Fermi e estamos confiantes que vamos fazer mais descobertas empolgantes no
futuro."
Fonte: Astronomia OnLine
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