Nosso Universo pode não ter surgido do Big Bang, mas dentro de um buraco negro em um Universo maior
O Big Bang é frequentemente descrito como o nascimento explosivo de nosso Universo - um momento singular em que o espaço, o tempo e a matéria passaram a existir. Mas e se esse não foi o início de fato? E se nosso Universo surgiu de outra coisa - algo mais familiar e radical ao mesmo tempo?
Ilustração de um buraco negro com
um disco de matéria brilhante em torno dele: cálculos mostram que colapso
gravitacional de uma nuvem de matéria pode atingir um estado de alta densidade
sem formar uma singularidade, ricocheteando em uma nova fase de expansão. ©
Vadim Sadovski/Shutterstock
Em um novo artigo publicado no
periódico científico Physical Review D, meus colegas e eu propomos uma
alternativa surpreendente. Nossos cálculos sugerem que o Big Bang não foi o
início de tudo, mas sim o resultado de um esmagamento ou colapso gravitacional
que formou um buraco negro muito grande - seguido de um “quique” dentro dele.
Essa ideia, que chamamos de
“Universo do buraco negro”, oferece uma visão radicalmente diferente das nossas
origens cósmicas, mas está totalmente fundamentada na física e observações
conhecidas.
O modelo cosmológico padrão
atual, baseado no Big Bang e na inflação cósmica (a ideia de que o Universo
primitivo cresceu rapidamente de tamanho), tem sido notavelmente bem-sucedido
na explicação da estrutura e da evolução do Universo. Mas isso tem um preço:
ele deixa algumas das questões mais fundamentais sem resposta.
Para começar, o modelo do Big
Bang começa com uma singularidade - um ponto de densidade infinita onde as leis
da física se rompem. Isso não é apenas uma falha técnica; é um problema teórico
profundo que sugere que não entendemos de fato o início de tudo.
Para explicar a estrutura em
grande escala do Universo, os físicos introduziram uma breve fase de rápida
expansão no Universo primitivo chamada inflação cósmica, alimentada por um
campo desconhecido com propriedades estranhas. Mais tarde, para explicar a
expansão acelerada observada atualmente, eles acrescentaram outro componente
“misterioso”: energia escura.
Novo modelo
Nosso novo modelo aborda essas
questões de um ângulo diferente - olhando para dentro em vez de para fora. Em
vez de começar com um Universo em expansão e tentar rastrear como ele começou,
consideramos o que acontece quando uma coleção de matéria excessivamente densa
entra em colapso sob a ação da gravidade.
Esse é um processo conhecido:
estrelas colapsam em buracos negros, que estão entre os objetos mais bem
compreendidos da física. Mas o que acontece dentro de um buraco negro, além do
horizonte de eventos do qual nada pode escapar, continua sendo um mistério.
Em 1965, o físico britânico Roger
Penrose provou que, sob condições muito gerais, o colapso gravitacional deve
levar a uma singularidade. Esse resultado, aprofundado pelo falecido físico
britânico Stephen Hawking e outros, sustenta a ideia de que as singularidades -
como a do Big Bang - são inevitáveis.
A ideia ajudou Penrose a ganhar
uma parte do Prêmio Nobel de física de 2020 e inspirou o best-seller mundial de
Hawking “Uma Breve História do Tempo: Do Big Bang aos Buracos Negros”. Mas há
uma ressalva. Esses “teoremas da singularidade” se baseiam na “física clássica”
que descreve objetos macroscópicos comuns. Se incluirmos os efeitos da mecânica
quântica, que rege o minúsculo microcosmo de átomos e partículas, como devemos
fazer em densidades extremas, a história pode mudar.
Em nosso novo artigo, mostramos
que o colapso gravitacional não precisa terminar em uma singularidade.
Encontramos uma solução analítica exata - um resultado matemático sem
aproximações. Nossa matemática mostra que, à medida que nos aproximamos da
singularidade potencial, o tamanho do Universo muda como uma função
(hiperbólica) do tempo cósmico.
Essa solução matemática simples
descreve como uma nuvem de matéria em colapso pode atingir um estado de alta
densidade e, em seguida, ricochetear, voltando para fora em uma nova fase de
expansão.
Mas por que os teoremas de
Penrose proíbem tais resultados? Tudo se resume a uma regra chamada princípio
de exclusão quântica de Pauli, que afirma que duas partículas de um tipo
conhecido como férmions idênticas não podem ocupar o mesmo estado quântico (como
momento angular ou “spin”).
E mostramos que essa regra impede
que as partículas na matéria em colapso sejam comprimidas indefinidamente. Como
resultado, o colapso é interrompido e revertido. O “quique” não é apenas
possível - ele é inevitável sob as condições certas.
Crucialmente, esse quique ocorre
inteiramente dentro da estrutura da Relatividade Geral, que se aplica em
grandes escalas, como estrelas e galáxias, combinada com os princípios básicos
da mecânica quântica - não são necessários campos exóticos, dimensões extras ou
física especulativa.
O que emerge do outro lado do
quique é um Universo notavelmente parecido com o nosso. Ainda mais
surpreendente é o fato de que o repique produz naturalmente as duas fases
distintas da expansão acelerada - inflação e energia escura - impulsionadas não
por campos hipotéticos, mas pela física do próprio repique.
Previsões testáveis
Um dos pontos fortes desse modelo
é que ele faz previsões que podem ser testadas. Ele prevê uma quantidade
pequena, mas diferente de zero, de curvatura espacial positiva - o que
significa que o Universo não é exatamente “plano”, mas ligeiramente curvado,
como a superfície da Terra.
Isso é simplesmente uma relíquia do pequeno excesso de densidade inicial que desencadeou o colapso. Se observações futuras, como a ainda em andamento missão Euclid, confirmarem uma pequena curvatura positiva, isso seria um forte indício de que nosso Universo de fato emergiu de tal quique. Ela também faz previsões sobre a taxa de expansão do Universo atual, algo que já foi verificado.
Esse modelo faz mais do que
corrigir problemas técnicos da Cosmologia padrão. Ele também pode lançar nova
luz sobre outros mistérios profundos em nossa compreensão do Universo primitivo
- como a origem dos buracos negros supermaciços, a natureza da matéria escura
ou a formação e evolução hierárquica das galáxias.
Essas questões serão exploradas
por futuras missões espaciais, como a Arrakihs, que estudará características
difusas, como halos estelares (uma estrutura esférica de estrelas e aglomerados
globulares que circundam as galáxias) e galáxias satélites (galáxias menores
que orbitam galáxias maiores), que são difíceis de detectar com telescópios
tradicionais na Terra e que nos ajudarão a melhor entender a matéria escura e a
evolução das galáxias.
Esses fenômenos também podem
estar ligados a relíquias de objetos compactos - como buracos negros - que se
formaram durante a fase de colapso e sobreviveram ao quique.
O “Universo do buraco negro”
também oferece uma nova perspectiva sobre nosso lugar no Cosmos. Nessa
estrutura, todo o nosso Universo observável está no interior de um buraco negro
formado em um Universo “pai” maior.
Não somos especiais, assim como a
Terra não era na visão de mundo geocêntrica que levou Galileu (o astrônomo que
sugeriu que a Terra girava em torno do Sol nos séculos XVI e XVII) a ser
colocado em prisão domiciliar.
Não estamos testemunhando o
nascimento de tudo a partir do nada, mas sim a continuação de um ciclo cósmico
- um ciclo moldado pela gravidade, pela mecânica quântica e pelas profundas
interconexões entre elas.
Msn.com

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