O antigo campo magnético de Mercúrio provavelmente evoluiu ao longo do tempo
Imagem com cores melhoradas do terreno de Mercúrio, captada pela MESSENGER.
Crédito: NASA/JHUAPL/Instituto Carnegie
Um novo estudo diz que os
antigos polos magnéticos de Mercúrio estavam longe da localização dos seus
polos de hoje, implicando que o seu campo magnético, como o da Terra, mudou com
o tempo.
Alguns planetas têm núcleos
metálicos líquidos. Os cientistas geralmente pensam que o campo magnético de um
planeta provém dos movimentos fluídos do seu núcleo metálico. O campo magnético
cria uma magnetosfera que rodeia o planeta. A magnetosfera da Terra bloqueia
grande parte da radiação cósmica e solar, permitindo que a vida exista.
Mercúrio é o outro corpo do
Sistema Solar, além da terra, com um núcleo fundido confirmado capaz de gerar
um campo magnético.
Uma nova investigação
publicada na revista Journal of Geophysical Research: Planets descobriu que os
antigos polos magnéticos de Mercúrio, chamados paleopolos, mudaram ao longo do
seu passado. O novo estudo também sugere que o legado magnético de Mercúrio
pode ser mais complicado do que se pensava anteriormente.
O estudo dos campos
magnéticos dos outros planetas ajuda os cientistas a entender como os campos
magnéticos evoluem, inclusive na Terra. A observação do comportamento de outros
núcleos metálicos ajuda os cientistas a entender mais sobre a formação inicial
e subsequente maturação dos planetas no Sistema Solar.
Os cientistas sabem que
Mercúrio evoluiu ao longo do tempo, mas não podem dizer definitivamente como,
disse Joana S. Oliveira, astrofísica do ESTEC (European Space Research and
Technology Centre) da ESA em Noordwijk, Países Baixos, autora principal do
estudo.
Turbulência magnética no
Sistema Solar
As alterações no campo
magnético não são específicas a Mercúrio. O polo norte magnético da Terra
vagueia entre 55 e 60 km por ano enquanto o polo magnético sul da Terra cerca
de 10 a 15 km. A orientação do seu campo magnético já inverteu mais de 100
vezes ao longo dos seus 4,5 mil milhões de anos.
Os cientistas usam rochas
para estudar como os campos magnéticos dos planetas evoluem. As rochas ígneas,
criadas a partir do arrefecimento de lava, podem preservar um registo de como o
campo magnético era no momento em que as rochas arrefeceram. O material
magnético de arrefecimento das rochas alinha-se com o campo do núcleo. Este
processo é chamado de magnetização termo-remanescente. Os geólogos analisaram
rochas ígneas para determinar que a última inversão do campo magnético da Terra
ocorreu há mais ou menos 780.000 anos atrás.
A Terra e a Lua são os únicos
estudos de caso que os cientistas possuem para mudanças nos polos magnéticos
dos corpos planetários, porque não há amostras de rochas de outros planetas.
"Se queremos encontrar
pistas do passado, fazendo uma espécie de arqueologia do campo magnético, as
rochas precisam de ser magnetizadas de maneira mais permanente," disse
Oliveira.
Usando a arqueologia
planetária para descobrir a história magnética de Mercúrio
Investigações anteriores já
tinham estudado o campo magnético atual de Mercúrio, mas não havia como estudar
o campo magnético da crosta sem observações a baixa altitude. Então, em 2015, a
sonda MESSENGER começou a sua descida até à superfície de Mercúrio. Recolheu
três meses de informações a baixa altitude sobre Mercúrio durante a sua
descida. Algumas dessas informações revelaram detalhes sobre a magnetização
crustal de Mercúrio. O novo estudo examinou essas diferentes regiões crustais
para extrapolar a estrutura magnética do núcleo antigo de Mercúrio.
"Existem vários modelos
da evolução do planeta, mas ninguém usou o campo magnético da crosta para obter
a evolução do planeta," disse Oliveira.
Os dados a baixa altitude da
MESSENGER, durante o seu percurso de descida, detetaram crateras antigas com
diferentes assinaturas magnéticas do que a maioria dos terrenos observados pela
MESSENGER. Os investigadores pensavam que as crateras, formadas há cerca de 4,1
a 3,8 mil milhões de anos, podiam conter pistas sobre os paleopolos de
Mercúrio.
As crateras são mais
propensas a ter rochas magnetizadas termo-remanescentes. Durante a sua
formação, a energia de um impacto faz com que o solo derreta, dando ao material
magnético a hipótese de se realinhar com o atual campo magnético do planeta. À
medida que esse material solidifica, preserva a direção e a posição do campo
magnético do planeta como um instantâneo no tempo.
Oliveira e colegas usaram
observações de naves espaciais de cinco crateras com irregularidades
magnéticas. Eles suspeitavam que essas crateras tinham sido formadas durante
uma altura com uma diferente orientação de campo magnético da de hoje. Eles
modelaram o antigo campo magnético de Mercúrio com base nos dados da cratera
para estimar as possíveis localizações dos paleopolos de Mercúrio. A área que a
MESSENGER sobrevoou e registou durante a sua queda fatídica foi limitada, de
modo que os cientistas só puderam usar medições de parte do hemisfério norte.
Surpresas no paleopolo
Os investigadores descobriram
que os antigos polos magnéticos de Mercúrio estavam longe do atual polo sul
geográfico do planeta e podem ter mudado ao longo do tempo, o que foi
inesperado. Eles esperavam que os polos se agrupassem em dois pontos mais
próximos do eixo de rotação de Mercúrio no norte e sul geográficos do planeta.
No entanto, os polos estavam distribuídos aleatoriamente e eram todos
encontrados no polo sul.
Os paleopolos não se alinham
com o atual polo norte magnético de Mercúrio ou com o polo geográfico sul,
indicando que o campo magnético dipolar do planeta se moveu. Os resultados
reforçam a teoria de que a evolução magnética de Mercúrio foi muito diferente
da da Terra ou até mesmo de outros planetas no Sistema Solar. Eles também
sugerem que o planeta pode ter mudado ao longo do seu eixo, num evento chamado verdadeira
caminhada polar, onde as localizações geográficas dos polos norte e sul mudam.
A Terra tem um campo dipolar
com dois polos, mas Mercúrio tem um campo dipolar-quadrupolar com dois polos e
uma mudança no equador magnético. O seu antigo campo magnético pode ter sido
parecido com um destes, ou até mesmo ser multipolar com "linhas de campo
parecidas a esparguete," finalizou Oliveira. Não há como saber sem várias
amostras físicas de rochas de Mercúrio, concluiu.
Oliveira espera que a nova
missão a Mercúrio, BepiColombo, recolha mais dados do campo magnético e
potencialmente restrinja as conclusões do estudo.
Fonte: Ccvalg.pt
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