Um flash e um tremor
O tamanho atual do Sol (agora na sua sequência principal) em comparação com o tamanho estimado durante a sua fase de gigante vermelha no futuro.Crédito: Wikipedia
Daqui
a aproximadamente cinco mil milhões de anos, quando o Sol esgotar o hidrogénio
no seu núcleo, vai inchar e tornar-se numa gigante vermelha. Esta fase da sua
vida - e a de outras estrelas com até o dobro da sua massa - é relativamente curta
em comparação com a vida de mais de 10 mil milhões de anos do Sol. A gigante
vermelha brilhará 1000 vezes mais do que o Sol e, de repente, o hélio nas
profundezas do seu núcleo começará a fundir-se com o carbono num processo
chamado "flash do núcleo de hélio". Depois disto, a estrela terá 100
milhões de uma calma fusão de hélio.
Os
astrofísicos há mais de 50 anos que preveem estes flashes na teoria e nos
modelos, mas nenhum foi até agora observado. No entanto, um novo estudo
publicado na revista Nature Astronomy Letters sugere que isso pode mudar em
breve. Os
efeitos do flash do núcleo de hélio são claramente previstos pelos modelos, mas
não encontrámos observações que os reflitam diretamente," disse o coautor
Jørgen Christensen-Dalsgaard, académico do Instituto Kavli para Física Teórica
da Universidade da Califórnia em Santa Barbara, EUA, e professor da
Universidade de Aarhus, na Dinamarca.
Uma
estrela como o Sol é alimentada pela fusão de hidrogénio em hélio a
temperaturas que rondam os 15 milhões Kelvin. O hélio, no entanto, requer uma
temperatura muito mais alta do que o hidrogénio, por volta dos 100 milhões
Kelvin, para começar a fundir-se em carbono, de modo que simplesmente se
acumula no núcleo enquanto uma concha de hidrogénio continua a arder em seu
redor. Entretanto, a estrela expande-se para um tamanho comparável à órbita da
Terra. Eventualmente, o núcleo da estrela atinge as condições perfeitas,
despoletando uma ignição violenta do hélio: o flash do núcleo de hélio. O
núcleo sofre vários flashes ao longo dos 2 milhões de anos seguintes e, em
seguida, estabelece-se num estado mais estático, onde passa a queimar todo o
hélio no núcleo em carbono e oxigénio ao longo de mais ou menos 100 milhões de
anos.
O estudo das frequências de oscilações de muitas estrelas fornece informações sobre a evolução estelar, conhecendo como os núcleos das estrelas mudam (começando perto do canto inferior esquerda na sequência acima) desde os núcleos que queimam hidrogénio até aos núcleos que queimam hélio, com estágios intermédios as conchas da fusão de hidrogénio se expandem para tamanhos de gigantes vermelhas. Uma estrela que funde hidrogénio e uma estrela que funde hélio são indistinguíveis observando apenas as suas propriedades à superfície. No interior, são radicalmente diferentes.Crédito: Thomas Kallinger, Universidade da Columbia Britânica e Universidade de Viena
O
flash do núcleo de hélio desempenha um papel essencial na nossa compreensão dos
ciclos de vida de estrelas de baixa massa. Infelizmente, a recolha de dados dos
núcleos de estrelas distantes é incrivelmente difícil, de modo que os
cientistas ainda não conseguiram observar este fenómeno.
O
poder dos telescópios espaciais modernos como o Kepler, CoRoT e agora o TESS
(Transiting Exoplanet Survey Satellite) da NASA promete mudar isto. "A
disponibilidade de medições muito sensíveis a partir do espaço tornou possível
a observação de oscilações subtis no brilho de um número muito grande de
estrelas," explicou Christensen-Dalsgaard.
O
flash do núcleo de hélio produz uma série de ondas diferentes que se propagam
através da estrela. Isto faz com que a estrela vibre como um sino, que se
manifesta como uma fraca variação no seu brilho geral. As observações das
pulsações estelares já ensinaram os astrónomos sobre os processos dentro das
estrelas da mesma maneira que os geólogos aprendem sobre o interior da Terra
estudando sismos. Esta técnica, conhecida como asterossismologia, cresceu para
se tornar num campo próspero da astrofísica.
O
flash do núcleo ocorre repentinamente e, como um sismo, começa com um evento
muito energético seguido por uma série de eventos sucessivamente mais fracos ao
longo dos 2 milhões de anos seguintes - um período relativamente curto na vida
da maioria das estrelas. Como mostra um artigo publicado em 2012, liderado pelo
diretor do Instituto Kavli para Física Teórica Lars Bildsten e pelo colega
sénior Bill Paxton, as frequências das pulsações destas estrelas são muito
sensíveis às condições no núcleo. Como resultado, a asterossismologia poderia
fornecer aos cientistas informações que testam a nossa compreensão destes
processos.
"Ficámos
ansiosos pela altura em que estas novas capacidades espaciais nos possam
confirmar esta peça há muito estudada da evolução estelar. No entanto, não
considerámos a possibilidade ainda mais empolgante que estes autores exploraram
de usar a estrela vigorosamente convectiva para realmente ver a estrela a
'vibrar'," disse Bildsten.
O
principal objetivo do novo estudo foi determinar se estas regiões intermitentes
podem excitar pulsações grandes o suficiente para serem observadas. E, após
meses de análises e simulações, os investigadores descobriram que muitas devem
ser relativamente fáceis de observar.
"Fiquei
certamente surpreso ao ver que o mecanismo funciona tão bem," salientou
Christensen-Dalsgaard.
O
novo e promissor ângulo detalhado no artigo científico é que os astrónomos têm
estudado os processos de um tipo muito especial - e até agora não muito bem
entendido - de estrela designado subanã B. Estas são antigas gigantes vermelhas
que, por razões desconhecidas, perderam a maior parte da sua camada exterior de
hidrogénio. As estrelas subanãs B fornecem aos cientistas uma oportunidade
única de investigar mais diretamente o núcleo quente de uma estrela. Além
disso, a fina camada restante de hidrogénio não é espessa o suficiente para
amortecer as oscilações dos flashes repetidos do núcleo de hélio, dando aos
investigadores a chance de os observar potencialmente diretamente.
Este
estudo fornece as primeiras informações observacionais sobre os processos
complexos previstos pelos modelos estelares na ignição da fusão de hélio.
"Este trabalho aproveitou fortemente uma série de cálculos dinâmicos de
fluídos liderados pelo ex-companheiro do mesmo instituto Daniel Lecoanet,"
realça Bildsten. "Se tudo der certo, estas estrelas podem fornecer um novo
campo de teste para este quebra-cabeças fundamental da astrofísica."
Christensen-Dalsgaard
disse que está ansioso por aplicar estas descobertas aos dados reais. E, de
facto, os flashes do núcleo de hélio podem já ter sido observados. Várias das
estrelas observadas pelo CoRoT e pelo Kepler mostram oscilações inexplicáveis
que parecem semelhantes às previsões de flashes do núcleo de hélio. O TESS mostrar-se-á
crucial nesta pesquisa futura, explicou, uma vez que observará uma faixa
inteira de estrelas, incluindo várias onde estas pulsações podem ser
detetáveis. Isto fornecerá mais testes fortes dos modelos e uma visão do que o
futuro reserva para o nosso próprio Sol.
Fonte: Astronomia OnLine
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