Perscrutando o núcleo empoeirado de uma galáxia para estudar um buraco negro supermassivo ativo

 Investigadores vão em breve mapear e modelar o núcleo da galáxia vizinha Centaurus A com o Telescópio Espacial James Webb da NASA.

Centaurus A ostenta um disco central deformado de gás e poeira, que é evidência de uma colisão e fusão com outra galáxia. Também tem um núcleo galáctico ativo que emite fatos periodicamente. É a quinta galáxia mais brilhante do céu e fica a apenas 13 milhões de anos-luz da Terra, tornando-se um alvo ideal para estudar um núcleo galáctico ativo - um buraco negro supermassivo que emite jatos e ventos - com o Telescópio Espacial James Webb da NASA. Crédito: raios-X - NASA/CXC/SAO; ótico - Rolf Olsen; infravermelho - NASA/JPL-Caltech; rádio - NRAO/AUI/NSF/Univ.de Hertfordshire/M. Hardcastle 

Centaurus A é uma galáxia gigante, mas as suas aparições em observações telescópicas podem enganar. Faixas de poeira escura e jovens enxames de estrelas azuis, que cruzam a sua região central, são aparentes no ultravioleta, no visível e no infravermelho próximo, pintando uma paisagem bastante moderada. Mas se mudarmos para comprimentos de onda em raios-X e rádio desvenda-se uma cena muito mais "barulhenta": do núcleo da galáxia elíptica disforme, jatos espetaculares de material irromperam do seu buraco negro supermassivo - conhecido como núcleo galáctico ativo - enviando material para o espaço muito além dos limites da galáxia. 

O que, precisamente, está a acontecer no seu núcleo para provocar toda esta atividade? As próximas observações lideradas por Nora Lützgendorf e Macarena García Marín da ESA usando o Telescópio Espacial James Webb da NASA permitirão aos cientistas examinar através do seu núcleo empoeirado em alta resolução para, pela primeira vez, começar a responder a estas perguntas. 

"Há tanta coisa a acontecer em Centaurus A," explica Lützgendorf. "O gás, o disco e as estrelas da galáxia movem-se sob a influência do seu buraco negro supermassivo central. Dado que a galáxia está tão perto de nós, seremos capazes de usar o Webb para criar mapas bidimensionais para ver como o gás e as estrelas se movem na sua região central, como são influenciados pelos jatos do seu núcleo galáctico ativo e, em última análise, caracterizar melhor a massa do seu buraco negro." 

Uma rápida retrospetiva 

Cliquemos no botão "retroceder" para rever um pouco do que já se sabe sobre Centaurus A. É bem estudada porque está relativamente próxima - a cerca de 13 milhões de anos-luz - o que significa que podemos resolver claramente a galáxia inteira. O primeiro registo foi feito em meados do século XIX, mas os astrónomos perderam o interesse até à década de 1950 porque a galáxia parecia ser uma galáxia elíptica quieta, embora deformada. Assim que os investigadores começaram a observá-la com radiotelescópios nas décadas de 1940 e 50, Centaurus A tornou-se radicalmente mais interessante - os seus jatos tornaram-se visíveis. Em 1954, os cientistas descobriram que Centaurus A é o resultado de duas galáxias que se fundiram, o que mais tarde foi estimado ter ocorrido há 100 milhões de anos. 

  Os buracos negros supermassivos, que ficam no centro das galáxias, são vorazes. Periodicamente, "sorvem" ou "engolem" os discos giratórios de gás e poeira que os orbitam, o que pode resultar em fluxos massivos que afetam a formação de estrelas localmente e mais longe. Quando o Telescópio Espacial James Webb da NASA começar a observar os núcleos das galáxias, os seus instrumentos infravermelhos vão perfurar através da poeira para fornecer imagens e dados incríveis de alta resolução que permitem aos investigadores aprender precisamente como um processo desencadeia outro e como criam um enorme ciclo de feedback. Crédito: NASA, ESA e L. Hustak (STScI)

Com mais observações no início dos anos 2000, os investigadores estimaram que há cerca de 10 milhões de anos, o seu núcleo galáctico ativo disparou jatos gémeos em direções opostas. Quando examinada em todo o espectro eletromagnético, desde raios-X ao rádio, fica claro que há muito mais nesta história que ainda precisamos de aprender. 

"Os estudos em vários comprimentos de onda de qualquer galáxia são como camadas de uma cebola. Cada comprimento de onda mostra algo diferente," disse Marin. "Com os instrumentos de infravermelho próximo e médio do Webb, veremos gás e poeira muito mais frios do que em observações anteriores e aprenderemos muito mais sobre o ambiente no centro da galáxia." 

Visualizando os dados do Webb 

A equipa liderada por Lützgendorf e Marín vai observar Centaurus A não apenas obtendo imagens com o Webb, mas reunindo dados conhecidos como espectros, que espalham a luz nos seus comprimentos de onda componentes, como um arco-íris. Os espectros do Webb vão revelar informações de alta resolução sobre as temperaturas, velocidades e composições do material no centro da galáxia. 

Em particular, o NIRSpec (Near Infrared Spectrograph) e o MIRI (Mid-Infrared Instrument) do Webb vão fornecer à equipa de investigação uma combinação de dados: uma imagem mais um espectro de cada pixel dessa imagem. Isto permitirá que os investigadores construam intricados mapas 2D dos espectros que os ajudarão a identificar o que está a acontecer por trás do véu de poeira no centro - e analisá-lo em profundidade de muitos ângulos. 

Compare este estilo de modelagem com a análise de um jardim. Da mesma forma que os botânicos classificam as plantas com base em conjuntos específicos de características, estes cientistas vão classificar os espectros do MIRI do Webb para construir "jardins" ou modelos. "Se tirarmos uma foto de um jardim a uma grande distância," explicou Marín, "veremos algo verde, mas com o Webb, vamos poder ver folhas e flores individuais, os seus caules e talvez o solo por baixo." 

À medida que a equipa de pesquisa analisa os espectros, vão construir mapas de partes individuais do jardim, comparando um espectro com outro espectro próximo. Isto é análogo a determinar que partes contêm que espécies de plantas com base nas comparações de "caules," "folhas," e "flores" à medida que avançam. 

"Quando se trata da análise espectral, fazemos muitas comparações," continuou Marín. "Se eu comparar dois espectros nesta região, talvez descubra que o que foi observado contém uma população proeminente de estrelas jovens. Ou talvez confirme quais as áreas que são poeirentas e aquecidas. Ou talvez identifiquemos emissão oriunda do núcleo galáctico ativo." 

Por outras palavras, o "ecossistema" de espectros tem vários níveis, que permitirão à equipa definir com melhor precisão o que está presente e onde está presente - o que é possível graças aos instrumentos infravermelhos especializados do Webb. E, dado que estes estudos terão como base os muitos que os antecederam, os astrónomos serão capazes de confirmar, refinar ou abrir novos caminhos identificando novas características. 

"Pesando" o buraco negro de Centaurus A 

A combinação de imagens e espectros fornecidos pelo NIRSpec e pelo MIRI permitirá que a equipa crie mapas de altíssima resolução das velocidades do gás e das estrelas no centro de Centaurus A. "Nós planeamos usar estes mapas para modelar como todo o disco no centro da galáxia se move para determinar com mais precisão a massa do buraco negro," explica Lützgendorf. 

Dado que os investigadores entendem como a gravidade de um buraco negro governa a rotação do gás próximo, podem usar os dados do Webb para "pesar" o buraco negro em Centaurus A. Com um conjunto mais completo de dados infravermelhos, também determinarão se partes diferentes do gás estão a comportar-se conforme o previsto. "Estou ansiosa por preencher totalmente os nossos dados," disse Lützgendorf. "Espero ver como o gás ionizado se comporta e gira, e onde podemos ver os jatos." 

Os investigadores também esperam abrir novos caminhos. "É possível que encontremos coisas que ainda não considerámos," explica Lützgendorf. "Em alguns aspetos, estaremos a cobrir um território completamente novo com o Webb." Marín concorda totalmente e acrescenta que é de valor incalculável aproveitar a grande quantidade de dados. "Os aspetos mais interessantes destas observações é o potencial para novas descobertas," disse. "Acho que podemos encontrar algo que nos faça olhar para trás para outros dados e reinterpretar o que foi visto antes."

Fonte: Astronomia OnLine

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