À medida que a Voyager 1 estuda o espaço interestelar, as suas medições de densidade "levantam ondas"
Até recentemente, todas as naves espaciais da história haviam feito todas as suas medições dentro da nossa heliosfera, a bolha magnética inflada pelo nosso Sol. Mas no dia 25 de agosto de 2012, a Voyager 1 da NASA fez algo diferente. Ao cruzar a fronteira da heliosfera, tornou-se o primeiro objeto feito pela humanidade a entrar - e medir - o espaço interestelar. Agora, oito anos na sua jornada interestelar, os dados da Voyager 1 estão a produzir novas informações sobre esta nova fronteira.
Esta impressão de artista mostra uma das sondas Voyager da NASA a entrar no espaço interestelar, ou o espaço entre as estrelas. Esta região é dominada por plasma expelido durante a morte de estrelas gigantes há milhões de anos. O plasma mais quente e mais esparso preenche o ambiente dentro da nossa bolha solar. Crédito: NASA/JPL-Caltech
Se a nossa heliosfera for um navio a navegar por águas interestelares, a Voyager 1 é um bote salva-vidas recém-lançado do convés, determinado a pesquisar as correntes. Por enquanto, quaisquer águas agitadas que sente são principalmente o rastro da nossa heliosfera. Mas, mais longe, vai sentir as agitações de fontes mais profundas no cosmos. Eventualmente, a presença da nossa heliosfera desaparecerá completamente das suas medições.
"Temos algumas ideias sobre o quão longe a Voyager precisará de chegar para começar a ver águas interestelares mais puras, por assim dizer," disse Stella Ocker, estudante de doutoramento da Universidade de Cornell em Ithaca, no estado norte-americano de Nova Iorque, e o mais novo membro da equipa da Voyager. "Mas não temos a certeza de quando vamos chegar a esse ponto."
O novo estudo de Ocker, publicado
na passada segunda-feira na revista Nature Astronomy, relata o que pode ser a
primeira medição contínua da densidade do material no espaço interestelar.
"Esta deteção fornece-nos uma nova maneira de medir a densidade do espaço
interestelar e abre um novo caminho para explorarmos a estrutura do meio
interestelar muito próximo," disse Ocker.
Quando imaginamos o material entre as estrelas - os astrónomos chamam-no de "meio interestelar", uma sopa difusa de partículas e radiação - podemos imaginar um ambiente calmo, silencioso e sereno. Isso seria um erro. Usei a frase 'meio interestelar quiescente' - mas podemos encontrar muito lugares que não são particularmente tranquilos," disse Jim Cordes, físico espacial de Cornell e coautor do artigo.
Tal como o oceano, o meio interestelar está cheio de ondas turbulentas. As maiores vêm da rotação da nossa Galáxia, à medida que o espaço se espalha e cria ondulações com dezenas de anos-luz de diâmetro. Ondas mais pequenas (embora ainda gigantescas) surgem de explosões de supernova, estendendo-se por milhares de milhões de quilómetros de ponta a ponta. As ondulações mais pequenas são geralmente do nosso próprio Sol, já que erupções solares enviam ondas de choque através do espaço que permeiam o revestimento da nossa heliosfera.
Estas ondas em quebra revelam pistas sobre a densidade do meio interestelar - um valor que afeta a nossa compreensão da forma da nossa heliosfera, o modo como as estrelas se formam e até mesmo a nossa própria localização na Via Láctea. À medida que estas ondas reverberam pelo espaço, vibram os eletrões em redor, que ressoam em frequências características, dependendo de quão amontoados estão. Quanto mais alto o tom desse zumbido, maior a densidade dos eletrões. O PWS (Plasma Wave Subsystem) da Voyager 1 – um instrumento em forma de "orelhas de coelho" que inclui duas antenas que se esticam 10 metros atrás da sonda - foi construído para ouvir esse "som".
Em novembro de 2012, três meses após sair da heliosfera, a Voyager 1 ouviu sons interestelares pela primeira vez. Seis meses depois, apareceu outro "assobio" - desta vez mais alto e ainda mais agudo. O meio interestelar parecia estar a ficar mais espesso, e depressa. Estes assobios momentâneos continuam em intervalos irregulares nos dados atuais da Voyager. São uma excelente maneira de estudar a densidade do meio interestelar, mas requerem um pouco de paciência.
"Só têm sido vistos cerca de uma vez por ano, de modo que depender deste tipo de eventos fortuitos significa que o nosso mapa da densidade do espaço interestelar fica um tanto ou quanto esparso," disse Ocker.
Ocker decidiu encontrar uma medição contínua da densidade do meio interestelar para preencher as lacunas - uma que não dependesse das ondas de choque ocasionais que se propagavam do Sol. Depois de filtrar os dados da Voyager 1, à procura de sinais fracos, mas consistentes, encontrou um candidato promissor. Começou a ganhar força em 2017, mais ou menos aquando de outro assobio.
"É praticamente um único tom," disse Ocker. "E, com o tempo, vemos mudanças - mas a forma como a frequência se move diz-nos como a densidade está a mudar."
Ocker chama ao novo sinal de emissão de onda de plasma e, também, parece rastrear a densidade do espaço interestelar. Quando os assobios abruptos apareceram nos dados, o tom da emissão sobe e desce com eles. O sinal também se assemelha a um observado na atmosfera superior da Terra, que é conhecido por rastrear a densidade de eletrões.
"Isto é realmente empolgante, porque somos capazes de amostrar regularmente a densidade ao longo de um trecho muito longo do espaço, o trecho mais longo que temos até agora," disse Ocker. "Isto fornece-nos o mapa mais completo da densidade e do meio interestelar visto pela Voyager."
Com base no sinal, a densidade de eletrões em torno da Voyager 1 começou a aumentar em 2013 e atingiu os seus níveis atuais em 2015, um aumento de densidade de aproximadamente 40 vezes. A nave espacial parece estar numa gama de densidade semelhante, com algumas flutuações, em todo o conjunto de dados que analisaram, que terminou no início de 2020.
Ocker e colegas estão atualmente
a tentar desenvolver um modelo físico de como a emissão das ondas de plasma é
produzida, que será a chave para a sua interpretação. Entretanto, o PWS da
Voyager 1 continua a enviar dados de cada vez mais longe de casa, onde cada
nova descoberta tem o potencial de nos fazer reimaginar o nosso lugar no
cosmos.
Fonte: Astronomia OnLine
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