Explicando o "colar de pérolas" de uma supernova

Os físicos recorrem frequentemente à instabilidade de Rayleigh-Taylor para explicar a formação de estruturas fluidas nos plasmas, mas essa pode não ser a história completa no que toca ao anel de aglomerados de hidrogénio em torno da supernova 1987A, sugere uma investigação da Universidade de Michigan. 

Imagem, no infravermelho próximo, do remanescente deixado pela supernova 1987A, obtida pelo Telescópio Espacial James Webb. Os aglomerados de hidrogénio conhecidos como "colar de pérolas" aparecem como um anel de pontos brancos à volta do centro azulado do remanescente estelar, ainda a brilhar intensamente devido à energia transmitida pela onda de choque da supernova. O número de aglomerados é consistente com o facto de a instabilidade de Crow ter causado a sua formação. Crédito: NASA, ESA, CSA, M. Matsuura (Universidade de Cardiff), R. Arendt (Centro de Voo Espacial Goddard da NASA e Universidade de Maryland, Baltimore), C. Fransson (Universidade de Estocolmo), J. Larsson (Instituto Real de Tecnologia KTH), A. Pagan (STScI)

Num estudo publicado na revista Physical Review Letters, a equipa argumenta que a instabilidade de Crow explica melhor o "colar de pérolas" que rodeia o remanescente estelar, lançando luz sobre um mistério astrofísico de longa data.

"A parte fascinante disto é que o mesmo mecanismo que desfaz os rastos dos aviões pode estar aqui em jogo", disse Michael Wadas, autor do estudo e estudante de engenharia mecânica aquando deste trabalho.

Nos rastos de condensação dos aviões, a instabilidade Crow cria ruturas na linha suave das nuvens devido ao fluxo de ar em espiral que sai da extremidade de cada asa, conhecido como vórtices de ponta de asa. Estes vórtices fluem uns para os outros, criando lacunas - algo que podemos ver devido ao vapor de água nos gases de escape. E a instabilidade de Crow pode fazer algo que a instabilidade de Rayleigh-Taylor não conseguiu: prever o número de aglomerados observados em torno do remanescente.

"A instabilidade de Rayleigh-Taylor pode dizer-nos da existência de aglomerados, mas seria muito difícil obter um número a partir dela", disse Wadas, que é agora bolseiro de pós-doutoramento no Instituto de Tecnologia da Califórnia.

SN 1987A está entre as mais famosas explosões estelares porque fica relativamente perto da Terra, a 163.000 anos-luz de distância, e a sua luz chegou à Terra numa altura em que existiam observatórios sofisticados para testemunhar a sua evolução. É a primeira supernova visível a olho nu desde a supernova de Kepler do ano de 1604, o que faz dela um acontecimento astrofísico incrivelmente raro que desempenhou um papel importante na compreensão da evolução estelar.

Embora ainda se desconheça muito sobre a estrela que explodiu, pensa-se que o anel de gás que a rodeava antes da explosão provém da fusão de duas estrelas. Essas estrelas "derramaram" hidrogénio no espaço à sua volta quando se tornaram gigantes azuis dezenas de milhares de anos antes da supernova. Essa nuvem de gás em forma de anel foi então fustigada pelo fluxo de partículas carregadas altamente velozes que se desprendiam da gigante azul, conhecido como vento estelar. Pensa-se que os aglomerados se formaram antes da explosão da estrela.

A simulação mostra a forma da nuvem de gás à esquerda e os vórtices, ou regiões de fluxo em rápida rotação, à direita. Cada anel representa um momento posterior na evolução da nuvem. Mostra como uma nuvem de gás que começa como um anel uniforme, sem rotação, se transforma num anel irregular à medida que os vórtices se desenvolvem. Eventualmente, o gás divide-se em aglomerados distintos. Crédito: Michael Wadas, Laboratório de Computação Científica e de Física de Fluxo da Universidade de Michigan

Os investigadores simularam a forma como o vento empurrava a nuvem para fora, ao mesmo tempo que arrastava a superfície, com a parte superior e inferior da nuvem a serem empurradas para fora mais rapidamente do que o centro. Isto fez com que a nuvem se enrolasse sobre si própria, o que desencadeou a instabilidade de Crow e fez com que se separasse em aglomerados bastante uniformes que se tornaram no colar de pérolas. A previsão de 32 está muito próxima dos 30 a 40 aglomerados observados em torno do remanescente de SN 1987A.

"Esta é uma grande parte da razão pela qual pensamos que se trata da instabilidade de Crow", disse Eric Johnsen, professor de engenharia mecânica da Universidade de Michigan e autor sénior do estudo.

A equipe viu indícios de que a instabilidade Crow poderia prever a formação de mais anéis de contas à volta da estrela, mais afastados do anel que aparece mais brilhante nas imagens telescópicas. Ficaram satisfeitos por ver que mais aglomerados parecem surgir na imagem do instrumento NIRCam (Near Infrared Camera) do Telescópio Espacial James Webb, publicada em agosto do ano passado, explicou Wadas.

A equipa também sugeriu que a instabilidade de Crow pode estar em jogo quando a poeira à volta de uma estrela se transforma em planetas, embora seja necessária mais investigação para explorar esta possibilidade.

Fonte: Astronomia OnLine

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