As primeiras estrelas que se formaram após o Big Bang podem ter sido encontradas por astrônomos
A busca pelas primeiras estrelas
do cosmos sempre teve um sabor de lenda científica: objetos tão antigos que sua
luz viajou por quase toda a idade do universo. Agora, um grupo liderado por Ari
Visbal, da University of Toledo, nos Estados Unidos, sugere ter encontrado um
desses fósseis cósmicos ao reexaminar registros do Telescópio Espacial James
Webb. A candidata atende pelo nome pouco poético de LAP1-B, mas sua história é
tudo menos comum.
Ilustração artística. Crédito: HypeScience.com
Há décadas, astrônomos tentam localizar a chamada População III, um grupo teórico de estrelas formadas logo após o Big Bang, compostas quase exclusivamente por hidrogênio e hélio. Essas estrelas brilhavam cerca de 200 milhões de anos após o nascimento do universo e, por serem extremamente massivas, viveram muito pouco antes de explodirem em supernovas. Localizá-las seria como encontrar as primeiras páginas de um livro que quase se apagou com o tempo.
Nessa nova análise, os
pesquisadores afirmam que LAP1-B apresenta exatamente as características
esperadas da População III. Essas estrelas seriam formadas essencialmente pelos
elementos primordiais, com apenas vestígios mínimos de lítio. Elas surgiram antes
que o universo tivesse tempo de produzir elementos mais pesados em usinas
estelares. Esse detalhe muda toda a interpretação do cenário cosmológico, pois
aponta para um momento em que ainda não havia “metais” no espaço — termo que,
na astronomia, inclui praticamente tudo mais pesado que o hélio e que aqui
aparece como formacao inicial sem os ingredientes complexos que vemos hoje
O estudo, publicado em The
Astrophysical Journal Letters, afirma que LAP1-B se formou no ambiente previsto
pelos modelos: um halo de matéria escura com aproximadamente 50 milhões de
massas solares. Isso é relevante porque a teoria descreve halos como estruturas
que funcionaram como “berçários escuros” para as primeiras estrelas, um pouco
como vilarejos isolados e silenciosos no meio do nada antigo sem o barulho das
galáxias que viríamos a conhecer.
O Enigma das Massas
Estelares e os Pequenos Agrupamentos
Outro ponto que chamou a atenção
dos cientistas é a massa dessas estrelas, supostamente entre 10 e 1.000 vezes
maior que a do Sol. Estrelas tão gigantes vivem rápido e morrem explosivamente,
por isso observar mesmo seus vestígios já é surpreendente. A equipe também
destacou que elas parecem ter se aglomerado em pequenos grupos totalizando
algumas milhares de massas solares algo coerente com o que as simulações de
formação estelar previam.
As propriedades do gás que
envolve LAP1-B reforçam essa interpretação. Esse material contém quantidades
mínimas de elementos pesados, como se tivesse sido recém-contaminado pelas
primeiras supernovas, ainda “aprendendo” a enriquecer o espaço com elementos
que mais tarde formariam planetas, oceanos e até ossos humanos Ao analisar esse
gás os pesquisadores argumentam que o sistema pode estar em uma fase
extremamente jovem logo após algumas dessas estrelas colossais terem explodido.
É curioso imaginar que esse
conjunto de estrelas possa representar um retrato vibrante de uma era em que o
universo ainda estava escuro e cheio de regiões vazias. Os modelos sugerem que
esses gigantes estelares influenciaram diretamente a forma como a luz começou a
viajar pelo espaço, permitindo que galáxias e estruturas maiores emergissem com
o tempo pois os astrônomos acreditam que essas primeiras explosões foram
cruciais para modificar o meio intergaláctico
Implicações e Próximos
Passos
Apesar do entusiasmo, os
pesquisadores ainda não chamam o achado de confirmação final. Modelos
computacionais para condições tão extremas ainda carregam incertezas e nem
todos os detalhes das primeiras supernovas são bem compreendidos Isso é o tipo
de problema que exige tanto observação quanto poder computacional crescente,
especialmente simulações que incluam física de plasma e radiação.
O uso da lente gravitacional foi
essencial para detectar LAP1-B. Esse fenômeno ocorre quando a luz de um objeto
distante é ampliada pela gravidade de outro objeto no caminho, funcionando como
uma lente cósmica. Sem esse truque natural, o brilho de LAP1-B provavelmente
seria sutil demais para ser captado por qualquer telescópio moderno e os
astrônomos ressaltam que combinar o poder do JWST com lentes gravitacionais
pode revelar muitos outros casos semelhantes no futuro.
Os autores do estudo sugerem que
LAP1-B pode ser apenas a primeira peça de um mosaico muito maior, algo como
olhar para um iceberg e perceber que há muito mais escondido sob a superfície
pois se outros sistemas semelhantes forem encontrados, teremos enfim uma
coleção que permitirá estudar a transição do universo escuro para o universo
luminoso sem depender mais apenas de simulações e hipóteses.
Muitos astrônomos sonham em
observar diretamente o nascimento da complexidade cósmica, e este trabalho
oferece algo próximo de uma janela para esse amanhecer. Fico imaginando o
contraste entre essa luz primordial e um céu moderno cheio de poluição luminosa
urbana: talvez as primeiras estrelas tenham sido tão intensas que, se
estivéssemos lá, pareceriam iluminar tudo como fogueiras gigantes em um deserto
interminável Essa ideia de que a história do universo está literalmente escrita
na luz ainda reverberando no espaço é uma das razões pelas quais a astronomia
permanece tão profundamente humana.
Hypescience.com

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