Poderia um acelerador de partículas “turbinado” destruir a Terra?
O acelerador de partículas chamado Colisor Relativístico de Íons Pesados (RHIC, na sigla em inglês), do Laboratório Nacional Brookhaven, Estados Unidos, é o segundo maior do mundo, atrás apenas do Grande Colisor de Hádrons (LHC), na Suíça.
Quando construído, o plano era usá-lo por 10 anos. Agora, 5 anos depois do “fim do prazo de validade”, ele vai receber uma atualização que vai permitir que aumente em 20 vezes o número de colisões além do que foi projetado, operando a uma luminosidade 18 vezes maior. A luminosidade, neste caso, é a razão entre interações detectadas em relação ao diâmetro da região de reações. Em outras palavras, ele será capaz de detectar 18 vezes mais interações. Parece uma coisa boa, mas nem todo mundo pensa assim. O professor de direito Eric E. Johnson, da Universidade da Dakota do Norte (EUA), e Michael Baram, outro professor de direito na Universidade de Boston (EUA), acham que os físicos deveriam analisar se o colisor continuará sendo seguro após a atualização. O receio deles é que, ao trabalhar com um número maior de energia e colisões, as chances da criação de microburacos negros e de strangelets aumente. Os strangelets são uma forma hipotética de matéria de quarks que, nas condições corretas, poderiam iniciar um processo de reação em cadeia que transformaria tudo que tocassem em matéria estranha, eventualmente tornando a Terra em uma esfera hiperdensa com algumas centenas de metros de diâmetro.
O curioso é que, pela teoria, a produção de strangelets pede energias menores que as energias máximas que os colisores estão acostumados a trabalhar, e o RHIC, projetado para funcionar na faixa dos 100 GeV, tem feito experimentos na faixa dos 7,3 GeV por longos períodos de tempo. Outro receio é que o RHIC ou outro colisor qualquer acabe criando um microburaco negro. Bastante assustador, não? Se você acha que já viu alguma discussão parecida no passado, você está absolutamente certo. Quando o LHC estava sendo finalizado, os físicos e cientistas tiveram que parar tudo e provar na ponta do lápis que ele era seguro, e que não destruiria a Terra. Os mesmos advogados que tentaram pará-lo agora estão querendo uma reavaliação da segurança do RHIC.
Mas o que há de real nestas ameaças? Esquecendo por um instante que os estrangelets são elementos hipotéticos, e que miniburacos negros, mesmo que existam e sejam gerados por algum acelerador de partículas não conseguiriam absorver matéria a uma taxa que os tornasse perigosos ao planeta, existe algum risco de abrirmos uma caixa de Pandora da ciência? Não. Na própria natureza existem fenômenos semelhantes aos criados por aceleradores de partículas e colisores, e ainda estamos seguros. Por exemplo, toda vez que uma estrela explode, ela acaba acelerando partículas a velocidades e energias muito maiores do que dos nossos aceleradores de partículas, e estas partículas viajam pelo universo praticamente sem perder energia até atingir algum planeta, colidindo com as moléculas na atmosfera deste planeta.
Nosso planeta é bombardeado constantemente por prótons, nêutrons, neutrinos, e outras partículas a velocidades fantásticas que nossos físicos só sonham em fazer algum dia, gerando uma chuva de sub-partículas que acabam se transformando em outras e sendo absorvidas ou sumindo por aí. A ciência já sabe disso há muito tempo, e importantes descobertas foram feitas no alto de montanhas, quando ainda não tínhamos aceleradores de partículas. Um dos físicos brasileiros mais famosos, César Lattes, descobriu o méson-pi desta forma.
Considerando que a Terra existe há pelo menos 4,5 bilhões de anos e ainda não foi transformada em uma esfera de matéria estranha superdensa, é de se supor que as condições para que isto aconteça são extremamente raras. Tão raras que um acelerador de partículas funcionando por 1.000 anos jamais conseguiria produzi-las. Por outro lado, pode ser que neste mesmo momento tenha começado uma reação em cadeia no nosso sol, e ele vá se transformar em uma esfera superdensa de matéria estranha em algumas horas. Quem sabe?
Fonte: Hypescience .com
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