Sonda MAVEN revela que maior parte da atmosfera marciana foi perdida para o espaço

Esta imagem ilustra o ambiente passado de Marte (direita) - que se pensa ter albergado água líquida e uma atmosfera mais espessa - "versus" o ambiente frio e seco de Marte atualmente (esquerda). A sonda MAVEN da NASA, em órbita do Planeta Vermelho, está a estudar a sua atmosfera superior, ionosfera e interações com o Sol e o vento solar.Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA

De acordo com novos resultados da sonda MAVEN da NASA, o vento e a radiação solares são os responsáveis pela remoção da atmosfera marciana, transformando Marte de um planeta que poderia ter suportado vida há milhares de milhões de anos atrás, num mundo frio e desértico.  Nós determinámos que a maioria do gás presente na atmosfera de Marte foi perdido para o espaço," realça Bruce Jakosky, investigador principal da MAVEN (Mars Atmosphere and Volatile Evolution Mission), da Universidade do Colorado em Boulder, EUA. 

A equipe fez esta determinação a partir dos últimos resultados, que revelam que aproximadamente 65% do árgon que já esteve presente na atmosfera foi perdido para o espaço. Jakosky é o autor principal de um artigo sobre esta investigação, publicado no passado dia 31 de março na revista Science. Em 2015, os membros da equipa da MAVEN anunciaram resultados que mostravam uma perda atmosférica atual e descreveram como é que essa atmosfera é removida. A análise presente usa medições da atmosfera de hoje para a primeira estimativa de quanto gás foi perdido ao longo do tempo.

A água líquida, essencial para a vida, não é hoje estável à superfície de Marte porque a sua atmosfera é demasiado fria e fina para a suportar. No entanto, evidências como características que se assemelham com leitos de rio e minerais que só se formam na presença de água líquida, indicam que o antigo clima marciano era muito diferente - quente o suficiente para a água correr à superfície durante longos períodos de tempo. Esta descoberta é um importante passo em frente para desvendar o mistério dos ambientes passados de Marte," salienta Elsayed Talaat, cientista do Programa MAVEN, na sede da NASA em Washington. 

Esta infografia mostra como Marte perdeu o árgon e outros gases, ao longo do tempo, devido a pulverização catódica. Crédito: Centro de Voo Espacial Goddard da NASA

"Num contexto mais amplo, esta informação ensina-nos mais sobre os processos que podem, ao longo do tempo, mudar a habitabilidade de um planeta. Existem muitas maneiras de um planeta perder parte da sua atmosfera. Por exemplo, reações químicas podem prender o gás nas rochas à superfície, ou uma atmosfera pode ser corroída por radiação e por um vento estelar da estrela que hospeda o planeta. Os novos resultados revelam que o vento solar e a radiação solar são os responsáveis pela maior parte da perda atmosférica de Marte e que o esgotamento foi suficiente para transformar o clima marciano. O vento solar é um fluxo fino de gás, eletricamente condutor, soprado constantemente a partir da superfície do Sol.

O Sol primitivo tinha uma radiação ultravioleta e um vento solar muito mais intensos, de modo que a perda atmosférica devido a esses processos foi provavelmente muito maior no passado de Marte. Segundo a equipa, esses processos podem ter sido os que controlaram o clima e habitabilidade do planeta. É possível que a vida microbiana possa ter existido à superfície no início da história de Marte. À medida que o planeta arrefecia e secava, qualquer forma de vida pode ter sido empurrada para locais subterrâneos ou para raros oásis à superfície.

Jakosky e a sua equipa obtiveram os novos resultados através da medição da abundância atmosférica de dois isótopos diferentes do gás árgon. Os isótopos são átomos do mesmo elemento, mas com massas diferentes. Uma vez que o mais leve dos dois isótopos escapa para o espaço com mais facilidade, deixa o gás remanescente enriquecido com o isótopo mais pesado. A equipa usou a abundância relativa dos dois isótopos, medida na atmosfera superior e à superfície, para estimar a fração do gás atmosférico perdido para o espaço.

Dado que um "gás nobre" não pode reagir quimicamente, não pode ser arrastado para as rochas; o único processo que pode remover gases nobres para o espaço é um processo físico chamado pulverização catódica pelo vento solar. Neste processo, os iões capturados pelo vento solar podem impactar Marte a altas velocidades e empurrar, fisicamente, o gás atmosférico para o espaço. A equipa rastreou o árgon porque só pode ser removido por pulverização catódica. Assim que os cientistas determinaram a quantidade de árgon perdida por pulverização, puderam usar esta informação para determinar a perda por pulverização catódica de outros átomos e moléculas, incluindo o dióxido de carbono (CO2).

O CO2 é de interesse porque é o principal constituinte da atmosfera de Marte e porque é um eficiente gás de efeito estufa que pode reter calor e aquecer o planeta. "Nós determinámos que a maioria do CO2 do planeta foi também perdido para o espaço por pulverização catódica," comenta Jakosky. "Existem outros processos que podem remover o CO2, de modo que este processo nos dá o valor mínimo de CO2 que foi perdido para o espaço."

A equipa fez a sua estimativa usando dados da atmosfera superior de Marte, recolhidos pelo instrumento NGIMS (Neutral Gas and Ion Mass Spectrometer) da MAVEN. Esta análise incluiu medições da superfície marciana obtidas pelo instrumento SAM (Sample Analysis at Mars) a bordo do rover Curiosity.

"As medições combinadas permitem uma melhor determinação de quanto árgon marciano foi perdido para o espaço ao longo de milhares de milhões de anos," comenta Paul Mahaffy do Centro de Voo Espacial Goddard da NASA em Greenbelt, no estado norte-americano de Maryland. "A utilização de medições de ambas as plataformas aponta para o valor que múltiplas missões têm em fazer medições complementares". Mahaffy, coautor do artigo, é o investigador principal do SAM e líder do instrumento NGIMS, ambos desenvolvidos em Goddard.
Fonte: Astronomia OnLine


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