O que aconteceria se o sol fosse substituído por um buraco negro
De acordo com o astrofísico Sean Raymond, do Observatório de Bordeaux,
na França, um buraco negro supermassivo poderia, teoricamente, ter até um
milhão de planetas potencialmente capazes de suportar a vida orbitando suas
proximidades. Raymond calculou a possibilidade de diferentes sistemas habitáveis
existirem em torno de diferentes buracos negros. Acho que podemos aprender com os extremos. Eles são basicamente os
limites da caixa em que estamos procurando. Este sistema [de um milhão de
planetas habitáveis] é um extremo – o mais cheio de recursos imagináveis. É uma
mistura divertida de imaginação e ciência”, disse o astrofísico ao portal
Space.com.
Entendendo os componentes dessa
mistura
Água líquida na superfície de um planeta é geralmente considerada pelos
astrônomos como um fator essencial para que ele evolua vida como a conhecemos.
Apenas um planeta habita a “zona habitável” do nosso sol e, portanto, possui
água líquida em sua superfície: a Terra. A história pode ser diferente para
outros sistemas estelares, contudo. Por exemplo, o sistema TRAPPIST-1 possui
três planetas do tamanho da Terra dentro de sua zona habitável.
Existem atualmente dois tipos de buracos negros que os cientistas
conhecem melhor: os buracos negros de massa estelar, que são iguais em massa a
alguns sóis e se formam quando estrelas gigantes morrem e colapsam em si
mesmas, e buracos negros supermassivos. Estes possuem milhões a bilhões de
vezes a massa do nosso sol, e devem existir nos centros da maioria das
galáxias, se não em todas.
Buracos negros são extremamente compactos. Um buraco negro com a mesma
massa do sol teria cerca de 6 km de largura. Em comparação, Sagittarius A*, o
buraco negro supermassivo que vive no coração da Via Láctea, tem uma massa de
cerca de 4 milhões de sóis e um diâmetro de cerca de 23,6 milhões de
quilômetros, ou pouco mais de 40% do tamanho da órbita de Mercúrio ao redor do
sol.
Um exercício teórico comum é imaginar o que mudaria se o sol fosse
substituído por um buraco negro de mesma massa no nosso sistema solar. A
resposta é que nada mudaria em relação às órbitas dos planetas – elas
permaneceriam as mesmas, mas a vida na Terra obviamente sofreria com a falta de
luz e calor em tal cenário. Se, no entanto, o buraco negro tivesse uma estrela companheira, as
coisas já seriam diferentes e a vida poderia existir próxima a ele. Confira as
várias possibilidades de sistemas com buracos negros.
Com um buraco negro de massa
estelar
Caso nosso sol tivesse um buraco negro companheiro de massa igual
orbitando próximo a ele – digamos, a um décimo de uma unidade astronômica (UA)
-, as órbitas dos planetas do sistema solar não mudariam muito. Uma UA é a
distância entre a Terra e o sol, ou cerca de 150 milhões de quilômetros. Mas a atração gravitacional do sol e seu buraco negro parceiro levaria
os planetas a completar suas órbitas um pouco mais rapidamente, com o ano da
Terra diminuindo de 365 dias para 258 dias, conforme explica Raymond.
No cenário acima, o sol e o buraco negro completariam uma órbita ao
redor um do outro a cada 2,9 dias. Isso significa que a quantidade de energia
que a Terra receberia do sol flutuaria entre 90% e 110% de sua média atual.
Com um buraco negro supermassivo
Além de imaginar a vida em torno de um buraco negro de massa estelar,
Raymond também calculou quantos planetas potencialmente habitáveis poderiam
caber em torno de um buraco negro supermassivo com um milhão de vezes a massa
do sol. Isso é quase tão grande quanto o buraco negro do centro da Via Láctea.
Tal objeto teria o diâmetro do nosso sol. Se o sol fosse substituído por ele,
550 planetas com a massa da Terra poderiam se encaixar em órbitas concêntricas
estáveis ao seu redor.
Isso porque a imensa força gravitacional do buraco negro puxaria mais
fortemente o lado de cada planeta que estivesse mais próximo dele. Isso
estenderia a zona habitável ao seu redor, mas não destruiria os planetas,
porque eles não estariam perto o suficiente do objeto para tanto. Uma maneira de criar uma zona habitável em torno de tal buraco negro
supermassivo é colocar estrelas entre ele e os planetas. Um anel de nove
estrelas semelhantes ao sol a 0,5 UA do buraco negro faria com que cada um dos
550 planetas nesse cenário fosse potencialmente habitável.
Como seria a vida em tal sistema?
“Seria muito interessante viver em um planeta neste sistema”, observou
Raymond. “Levaria apenas alguns dias para completar uma órbita ao redor do
buraco negro – cerca de 1,6 dias na borda interna da zona habitável e 4,6 dias
na borda externa. A menor distância entre dois desses planetas seria cerca de duas vezes
a distância entre a Terra e a lua. O vizinho planetário mais próximo pareceria
ter o dobro do tamanho da lua cheia no céu. A cada poucos dias, por conta das
órbitas dos objetos, mais mundos apareceriam no céu de cada planeta.
Os nove sóis também seriam um espetáculo interessante. Cada um
completaria sua órbita ao redor do buraco negro a cada 3 horas. “Isso significa
que, a cada 20 minutos, um dos sóis passaria por trás do buraco negro. Quando
isso acontece, a gravidade do buraco negro pode dobrar sua luz e agir como uma
lente”, explica Raymond. Isso faria com que os sóis parecessem anéis de luz no
céu. Além disso, a luz das estrelas seria esticada pela gravidade do buraco
negro. As estrelas mais próximas pareceriam mais vermelhas, e as mais
distantes mais azuis”, disse Raymond.
O cenário mais “lotado”
No cenário anterior, cada planeta está sozinho em sua órbita ao redor
do buraco negro supermassivo. Raymond também modelou o que aconteceria se
múltiplos planetas compartilhassem uma órbita ao redor de um buraco negro com a
massa de um milhão de sóis e um anel orbital de nove estrelas parecidas com o
sol. Neste caso, um milhão de planetas com a massa da Terra poderiam orbitar
dentro da zona habitável em 400 anéis, cada um com 2.500 planetas espaçados à
mesma distância entre a Terra e a lua. Novamente, os planetas levariam de 1,6 a
4,6 dias para completar uma órbita.
Em vez de colocar nove estrelas parecidas com o sol entre o buraco
negro e os planetas, Raymond também sugeriu que poderia haver 36 estrelas
parecidas com o sol em um anel de 6 UA de largura. Neste panorama, “cada
planeta é banhado pela luz do sol de todos os lados – não há lado noturno. Você
nunca se sentiria sozinho nesses sistemas – os outros planetas pareceriam
enormes no céu”, acrescentou Raymond.
Os planetas vizinhos seriam cerca de 10 vezes mais próximos do que a
lua é para a Terra, o que significa que pareceriam “cerca de 40 vezes maiores
no céu do que a lua cheia, aproximadamente o tamanho de um laptop mantido ao
alcance do braço”.
Também, os planetas estariam muito mais próximos do buraco negro, cada
um completando uma órbita em apenas cerca de 9 horas. Isso significa que eles
orbitariam a velocidades extraordinárias – cerca de 10% a da luz. De acordo com
a teoria da relatividade de Einstein, o tempo parece mover-se visivelmente mais
devagar quanto mais próximos estamos da velocidade da luz, então dois bebês
nascidos no mesmo instante em anéis diferentes envelheceriam a taxas
ligeiramente diferentes.
Viagem interestelar
Neste último cenário, as diferenças de velocidade entre os anéis seriam
grandes o suficiente para tornar impossível que uma nave viajasse de um anel
para outro com qualquer tecnologia atual. No entanto, cada mundo compartilharia seu anel com milhares de outros,
e a velocidade relativa entre os planetas vizinhos seria quase zero. “Um
elevador espacial poderia conectar tais planetas”, disse Raymond. Se cada par de planetas vizinhos ao longo de um determinado anel fosse
conectado, isso se pareceria com o “Ringworld”, a gigantesca megacultura
alienígena do romance de ficção científica de Larry Niven.
Por que teorizar sobre isso?
Segundo Raymond, é útil pensarmos sobre todos os sistemas planetários
possíveis que podem existir lá fora. Algumas descobertas poderiam ter sido
antecipadas se imaginássemos possibilidades que estão muito além da norma.
Esses sistemas são uma combinação de ficção científica e ‘cálculo’ nesse
sentido. O que desejo é simplesmente tentar forçar os limites do que achamos
ser possível”, concluiu o cientista.
Fonte: hypescience.com
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