Os cientistas podem ter descoberto uma nova classe de buracos negros
Impressão
de artista do buraco negro que os astrofísicos identificaram neste estudo. O
buraco negro (em baixo à esquerda) pode ser visto perto da gigante vermelha. A
descoberta mostra que pode existir uma classe de buracos negros desconhecida
dos astrónomos.Crédito: Jason Scults, Universidade Estatal do Ohio
Os buracos negros são uma
parte importante de como os astrofísicos tentam compreender o Universo - tão
importante que os cientistas estão a tentar construir um censo de todos os
buracos negros da Via Láctea. Mas uma nova investigação
mostra que à sua busca pode estar a faltar uma classe inteira de buracos negros
que não sabiam existir.
Num estudo publicado a semana
passada na revista Science, os astrónomos fornecem uma nova maneira de procurar
buracos negros e mostram que é possível que exista uma classe de buracos negros
ainda mais pequenos do que os buracos negros mais pequenos do Universo
conhecido.
"Estamos a mostrar esta
pista de que há outra população por aí que ainda precisamos investigar em busca
de buraco negros," disse Todd Thompson, professor de astronomia na
Universidade Estatal do Ohio e autor principal do estudo.
"Os cientistas estão a
tentar entender as explosões de supernovas, como estrelas massivas explodem,
como os elementos foram formados nas estrelas massivas. Portanto, se pudéssemos
revelar uma nova população de buracos negros, isso dir-nos-ia mais sobre quais
as estrelas que explodem, quais as que não explodem, quais as que formam
buracos negros, quais as que formam estrelas de neutrões. Abre uma nova área de
estudo."
Imagine um censo que contasse
apenas pessoas com mais de 1,75 m de altura - e imagine que os responsáveis
pelo censo nem sabiam que existiam pessoas com menos de 1,75 m de altura. Os
dados desse censo estariam incompletos, fornecendo uma imagem imprecisa da
população. É isto, essencialmente, que tem vindo a acontecer na procura por
buracos negros, disse Thompson.
Os astrónomos há muito tempo
que procuram buracos negros, que têm uma atração gravitacional tão forte que
nada - nem mesmo a matéria, nem mesmo a radiação - pode escapar. Os buracos
negros formam-se quando certas estrelas massivas morrem, encolhem e explodem.
Os astrónomos também estão à procura de estrelas de neutrões - estrelas
pequenas e densas que se formam quando algumas estrelas morrem e colapsam.
Estes dois tipos de objetos
podem reter informações interessantes sobre os elementos da Terra e como as
estrelas vivem e morrem. Mas, para descobrir essas informações, os astrónomos
precisam primeiro de descobrir onde estão os buracos negros. E para descobrir
onde estão os buracos negros, precisam de saber o que procurar.
Uma pista: os buracos negros
costumam existir no que se chama de sistemas binários. Isto significa
simplesmente que duas estrelas estão próximas o suficiente uma da outra para
estarem unidas pela gravidade numa órbita mútua. Quando uma dessas estrelas
morre, a outra pode permanecer, ainda orbitando o espaço onde a estrela morta -
agora um buraco negro ou uma estrela de neutrões - viveu e onde um buraco negro
ou estrela de neutrões se formou.
Durante anos, os buracos
negros que os cientistas conheciam tinham todos massas entre 5 e 15 vezes a
massa do Sol. As estrelas de neutrões conhecidas geralmente não têm mais do que
2,1 vezes a massa do Sol - se tivessem mais do que 2,5 massas solares, entrariam
em colapso para formar um buraco negro.
Mas, no verão de 2017, um
levantamento chamado LIGO (Laser Interferometer Gravitational-Wave Observatory)
observou a fusão de dois buracos negros numa galáxia a cerca de 1,8 mil milhões
de anos-luz de distância. Um desses buracos negros tinha cerca de 31 vezes a
massa do Sol; o outro cerca de 25 vezes a massa do Sol.
"Imediatamente, todos
dissemos 'uau!', porque era uma coisa espetacular," disse Thompsonn.
"Não apenas porque provou que o LIGO funcionava, mas porque as massas eram
enormes. Os buracos negros desse tamanho são importantes - nunca os tínhamos
visto antes."
Thompson e outros
astrofísicos há muito que suspeitavam que os buracos negros podiam ter tamanhos
fora da gama conhecida, e a descoberta do LIGO provou que os buracos negros
podiam ser maiores. Mas havia uma janela de tamanho entre as maiores estrelas
de neutrões e os buracos negros mais pequenos.
Thompson decidiu ver se podia
resolver esse mistério.
Ele e outros cientistas
começaram a vasculhar os dados do APOGEE (Apache Point Observatory Galactic
Evolution Experiment), que recolheu espectros de luz de cerca de 100.000
estrelas espalhadas pela Via Láctea. Thompson percebeu que os espectros podiam
mostrar que uma estrela podia estar em órbita de outro objeto: mudanças nos
espectros - um desvio para comprimentos de onda mais azuis, por exemplo,
seguido por um desvio para comprimentos de onda mais vermelhos - podiam indicar
que uma estrela estava a orbitar um companheiro ainda não observado.
Thompson começou a estudar os
dados à procura de estrelas que mostrassem essa mudança, indicando que podiam
estar em órbita de um buraco negro.
Seguidamente, restringiu os
dados do APOGEE para 200 das estrelas mais interessantes. Ele forneceu os dados
a um investigador associado da Universidade Estatal do Ohio, Tharindu
Jayasinghe, que compilou milhares de imagens de cada potencial sistema binário
com o ASAS-SN (All-Sky Automated Survey for Supernovae; o ASAS-SN já encontrou
aproximadamente 1000 supernovas).
Da análise de dados surgiu
uma estrela gigante vermelha que parecia orbitar algo, mas que, com base nos
seus cálculos, era provavelmente muito mais pequeno do que os buracos negros
conhecidos da Via Láctea, e muito maior do que maioria das estrelas de neutrões
conhecidas.
Após mais cálculos e dados
adicionais obtidos com o TRES (Tillinghast Reflector Echelle Spectrograph) e
com o satélite Gaia, perceberam que haviam encontrado um buraco negro de baixa
massa, com provavelmente mais ou menos 3,3 vezes a massa do Sol.
"O que fizemos aqui foi
criar uma nova maneira de procurar buracos negros, mas também identificámos
potencialmente um dos primeiros de uma nova classe de buracos negros de baixa
massa que os astrónomos não conheciam anteriormente," disse Thompson.
"As massas dos objetos dizem-nos mais sobre a sua formação e evolução,
mais sobre a sua natureza."
Fonte: Astronomia OnLine
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