Será que detetámos energia escura? Cientistas dizem que é uma possibilidade

Impressão de artista do Sol. Crédito: betmari (flickr.com) 

Um novo estudo, liderado por investigadores da Universidade de Cambridge e relatado na revista Physical Review D, sugere que alguns resultados inexplicáveis da experiência XENON1T na Itália podem ter sido produzidos pela energia escura, e não pela matéria escura para a qual a experiência foi projetada. 

Os cientistas construíram um modelo físico para ajudar a explicar os resultados, que podem ter tido origem em partículas de energia escura produzidas numa região do Sol com fortes campos magnéticos, embora sejam necessárias futuras experiências para confirmar esta explicação. Os investigadores dizem que o seu estudo pode ser um passo importante para a deteção direta da energia escura. 

Tudo o que os nossos olhos podem ver no céu e no nosso mundo quotidiano - desde pequenas luas a enormes galáxias, de formigas a baleias azuis - representa menos de 5% do Universo. O resto é escuro. Cerca de 27% é matéria escura - a força invisível que mantém as galáxias e a teia cósmica juntas - enquanto 68% é energia escura, que faz com que o Universo se expanda a um ritmo acelerado. 

"Apesar de ambos os componentes serem invisíveis, sabemos muito mais sobre a matéria escura, já que a sua existência foi sugerida já na década de 1920, enquanto a energia escura só foi descoberta em 1998," disse o Dr. Sunny Vagnozzi do Instituto Kavli para Astrofísica da Universidade de Cambridge, o primeiro autor do artigo. "Foram construídas experiências em grande escala, como a XENON1T, para detetar diretamente a matéria escura, procurando por sinais de matéria escura a 'atingir' a matéria comum, mas a energia escura é ainda mais elusiva." 

Para detetar a energia escura, os cientistas geralmente procuram interações gravitacionais: a maneira como a gravidade puxa objetos. E a grandes escalas, o efeito gravitacional da energia escura é repulsivo, afastando as coisas umas das outras e acelerando a expansão do Universo. 

Há cerca de um ano, a experiência XENON1T relatou um sinal inesperado, ou excesso, sobre o fundo esperado. "Estes tipos de excessos costumam ser acidentais, mas de vez em quando também podem levar a descobertas fundamentais," disse o Dr. Luca Visinelli, dos Laboratórios Nacionais Frascati, na Itália. "Nós explorámos um modelo no qual este sinal pode ser atribuído à energia escura, em vez da matéria escura que a experiência foi originalmente planeada para detetar." 

Na altura, a explicação mais popular para o excesso eram os axiões - partículas hipotéticas extremamente leves - produzidos no Sol. No entanto, esta explicação não resiste às observações, já que a quantidade de axiões que seriam necessários para explicar o sinal XENON1T alteraria drasticamente a evolução de estrelas muito mais massivas do que o Sol, em conflito com o que observamos. 

Estamos longe de compreender totalmente o que é a energia escura, mas a maioria dos modelos físicos da energia escura levaria à existência de uma chamada quinta força. Existem quatro forças fundamentais no Universo, e tudo o que não pode ser explicado por uma destas forças é às vezes referido como o resultado de uma quinta força desconhecida. 

No entanto, sabemos que a teoria da gravidade de Einstein funciona extremamente bem no Universo local. Portanto, qualquer quinta força associada à energia escura é indesejada e deve estar escondida, ou protegida, quando se trata de escalas pequenas, e só pode operar a escalas maiores onde a teoria de Einstein falha em explicar a aceleração do Universo. Para ocultar a quinta força, muitos modelos da energia escura estão equipados com os chamados mecanismos de proteção, que ocultam dinamicamente a quinta força. 

Vagnozzi e coautores construíram um modelo físico, que usava um tipo de mecanismo de triagem conhecido como triagem camaleónica, para mostrar que as partículas de energia escura produzidas nos fortes campos magnéticos do Sol poderiam explicar o excesso da experiência XENON1T. 

"A nossa triagem camaleónica interrompe a produção de partículas de energia escura em objetos muito densos, evitando os problemas enfrentados pelos axiões solares," disse Vagnozzi. "Também nos permite separar o que acontece no Universo local muito denso do que acontece a escalas maiores, onde a densidade é extremamente baixa." 

Os investigadores usaram o seu modelo para mostrar o que aconteceria no detetor se a energia escura fosse produzida numa região do Sol chamada tacoclina, onde os campos magnéticos são particularmente fortes. 

"Foi realmente surpreendente que esse excesso pudesse, em princípio, ter sido provocado pela energia escura em vez de matéria escura," disse Vagnozzi. "Quando as coisas encaixam assim, é realmente especial." 

Os seus cálculos sugerem que experiências como a XENON1T, que estão desenhadas para detetar a matéria escura, também podem ser usadas para detetar energia escura. No entanto, o excesso original ainda precisa de ser confirmado de forma convincente. "Primeiro, precisamos de saber que isto não foi realmente produto do acaso," disse Visinelli. "Se a XENON1T realmente viu algo, seria de esperar ver novamente um excesso semelhante em experiências futuras, mas desta vez com um sinal muito mais forte." 

Se o excesso for realmente resultado da energia escura, as próximas atualizações da experiência XENON1T, bem como experiências com objetivos semelhantes, como a LUX-Zeplin e PandaX-xT, significam que seria possível detetar diretamente a energia escura na próxima década.

Fonte: Astronomia OnLine

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