Entenda a imagem do buraco negro Sagitário A*
Sombra do buraco negro
Em 12 de maio de 2022, astrônomos do Telescópio Horizonte de Eventos
(EHT) divulgaram uma imagem do buraco negro Sagitário A* (lê-se A estrela) que
fica no centro da Via Láctea. O professor Chris Impey, astrônomo da
Universidade do Arizona, explica como a equipe obteve essa imagem e por que ela
é tão importante.
1. O que é Sagitário A*?
Sagitário A* fica no centro da nossa galáxia Via Láctea, na direção da
constelação de Sagitário. Por décadas, os astrônomos veem medindo explosões de
ondas de rádio de uma fonte extremamente compacta.
Na década de 1980, duas equipes de astrônomos começaram a rastrear os
movimentos das estrelas perto dessa misteriosa fonte de ondas de rádio. Eles
viram estrelas girando em torno de um objeto escuro a velocidades de até um
terço da velocidade da luz. Esses movimentos sugeriram que, no centro da Via
Láctea, havia um buraco negro com 4 milhões de vezes a massa do Sol. Reinhard
Genzel e Andrea Ghez mais tarde dividiram o Prêmio Nobel de Física por esta
descoberta.
O tamanho de um buraco negro é definido pelo seu horizonte de eventos -
uma distância do centro do buraco negro dentro da qual nada pode escapar. Os
cientistas já haviam calculado que Sagitário A* tem 26 milhões de quilômetros
de diâmetro.
O buraco negro da Via Láctea é enorme em comparação com os buracos
negros deixados para trás quando estrelas massivas morrem. Mas os astrônomos
pensam que existem buracos negros supermassivos no centro de quase todas as
galáxias. Comparado com a maioria deles, Sagitário A* é magrinho e normal.
2. O que a nova imagem mostra?
Os buracos negros em si são completamente escuros, pois nada, nem mesmo
a luz, pode escapar de sua gravidade. Mas os buracos negros são cercados por
nuvens de gás, e os astrônomos podem medir esse gás para inferir imagens dos
buracos negros em seu interior.
A região escura central na imagem é uma sombra projetada pelo buraco
negro no gás. O anel brilhante é o próprio gás brilhando. Os pontos brilhantes
no anel mostram áreas de gás mais quente que podem um dia cair no buraco negro.
Parte do gás visível na imagem está atrás do Sagitário A*. A luz desse
gás está sendo dobrada pela poderosa gravidade do buraco negro em direção à
Terra. Esse efeito, chamado de lente gravitacional, é uma previsão central da
relatividade geral.
3. Como esta imagem foi
produzida?
Buracos negros supermassivos são extremamente difíceis de medir. Eles
estão distantes e envoltos pelo gás e poeira que entope o centro das galáxias.
Eles também são relativamente pequenos em comparação com a vastidão do espaço.
De onde Sagitário A* fica, a 26.000 anos-luz de distância, no centro da Via
Láctea, apenas 1 em 10 bilhões de fótons de luz visível pode atingir a Terra -
a maioria é absorvida pelo gás no caminho.
As ondas de rádio passam pelo gás muito mais facilmente do que a luz
visível, então os astrônomos mediram as emissões de rádio do gás ao redor do buraco
negro. As cores laranja na imagem são representações dessas ondas de rádio.
A equipe usou oito radiotelescópios espalhados pelo mundo para coletar
dados sobre o buraco negro ao longo de cinco noites em 2017. Cada noite gerava
tantos dados que a equipe não conseguia enviá-los pela internet - eles tinham
que enviar discos rígidos físicos para onde eles processaram os dados.
Como os buracos negros são tão difíceis de ver, há muita incerteza nos
dados que os telescópios coletam. Para transformar tudo em uma imagem precisa,
a equipe usou supercomputadores para produzir milhões de imagens diferentes,
cada uma uma versão matematicamente viável do buraco negro com base nos dados
coletados e nas leis da física.
Eles então misturaram todas essas imagens para produzir a imagem final,
bonita e precisa. O tempo de processamento foi equivalente a 2.000 laptops
rodando em velocidade máxima por um ano.
4. Por que a nova imagem é tão
importante?
Em 2019, a equipe do Telescópio Horizonte de Eventos divulgou a
primeira imagem de um buraco negro - aquele está no centro da galáxia M87. O
buraco negro no centro daquela galáxia, chamado M87*, é um gigante 2.000 vezes
maior que Sagitário A* e 7 bilhões de vezes a massa do Sol. Mas, como Sagitário
A* está 2.000 vezes mais próximo da Terra do que o M87*, o Telescópio Horizonte
de Eventos conseguiu observar os dois buracos negros em uma resolução
semelhante - dando aos astrônomos a chance de aprender sobre o Universo
comparando os dois.
A semelhança das duas imagens é impressionante porque pequenas estrelas
e pequenas galáxias parecem e se comportam de maneira muito diferente das
grandes estrelas ou galáxias. Os buracos negros são os únicos objetos
existentes que respondem apenas a uma lei da natureza - a gravidade. E a
gravidade não se importa com a escala.
Nas últimas décadas, os astrônomos pensaram que existem buracos negros
maciços no centro de quase todas as galáxias. Enquanto M87* é um buraco negro
extraordinariamente grande, Sagitário A* é provavelmente bastante semelhante a
muitas das centenas de bilhões de buracos negros no centro de outras galáxias no
Universo.
5. Quais perguntas científicas
isso pode responder?
Há muito mais ciência a ser feita a partir dos dados que a equipe
coletou.
Uma via interessante de investigação decorre do fato de que o gás ao
redor de Sagitário A* está se movendo perto da velocidade da luz. Sagitário A*
é relativamente pequeno, e a matéria escorre para dentro dele muito lentamente
- se ele fosse do tamanho de um humano, ele consumiria a massa de um único grão
de arroz a cada milhão de anos. Mas, tirando muitas imagens, pode ser possível
observar o fluxo de matéria ao redor e para dentro do buraco negro em tempo
real. Isso permitiria aos astrofísicos estudar como os buracos negros consomem
matéria e crescem.
Uma imagem vale mais que mil palavras, e essa nova imagem já gerou 10 artigos científicos. Espero que venham muitos mais.
Fonte: Inovação Tecnológica
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