Exoplaneta pode revelar segredos sobre o limite da habitabilidade

A que distância pode um planeta rochoso estar de uma estrela e ainda assim ter água e vida?

Impressão de artista que mostra a potencial evolução do exoplaneta LP 890-9c de uma Terra quente para um seco Vénus. Crédito: Instituto Carl Sagan/R. Payne 

De acordo com uma nova investigação liderada por Lisa Kaltenegger, diretora do Instituto Carl Sagan e professora de astronomia na Faculdade de Artes e Ciências da Universidade Cornell, um exoplaneta recentemente descoberto pode ser a chave para resolver esse mistério, fornecendo informações importantes sobre as condições no limite interior da zona habitável de uma estrela e sobre a razão pela qual a Terra e Vénus se desenvolveram de forma tão diferente.

A equipa de Kaltenegger descobriu que a "super-Terra" LP 890-9c (também designada por SPECULOOS-2c), que orbita perto do limite interior da zona habitável do seu sistema, terá um aspeto muito diferente consoante ainda tenha oceanos quentes, uma atmosfera de vapor ou caso tenha perdido a água, partindo do princípio de que já teve oceanos como a Terra.

"Olhar para este planeta dir-nos-á o que se passa no limite interior da zona habitável - quanto tempo um planeta rochoso pode manter a habitabilidade quando começa a aquecer", disse Kaltenegger. "Vai ensinar-nos algo fundamental sobre a forma como os planetas rochosos evoluem com o aumento da luz estelar e sobre o que um dia nos irá acontecer a nós e à Terra."

Kaltenegger é a autora principal de um artigo científico publicado a 21 de junho na revista Monthly Notices of the Royal Astronomical Society: Letters. Os coautores são Rebecca Payne, investigadora do Departamento de Astronomia; Zifan Lin, estudante de doutoramento no MIT (Massachusetts Institute of Technology); James Kasting, professor emérito da Universidade Estatal da Pensilvânia; e Laetitia Delrez, investigadora pós-doutorada da Universidade de Liège, na Bélgica, que liderou uma equipa internacional que relatou a descoberta de LP 890-9c em setembro de 2022.

Um artigo complementar liderado por Jonathan Gomez Barrientos, estudante no Instituto de Tecnologia da Califórnia, demonstra que o Telescópio Espacial James Webb da NASA poderia distinguir entre as diferentes atmosferas potenciais do exoplaneta, tornando-o um alvo principal para o observatório. Kaltenegger é coautora juntamente com Ryan J. MacDonald, um antigo investigador de Cornell e agora bolseiro Sagan da NASA na Universidade de Michigan. 

LP 890-9c é uma das duas super-Terras que orbitam uma estrela anã vermelha situada a 100 anos-luz da Terra, anunciou a equipa de Delrez - que incluía Kaltenegger - no ano passado (o TESS - Transiting Exoplanet Survey Satellite - da NASA já tinha identificado LP 890-9b). Segundo a equipa, é possível que exista água líquida ou uma atmosfera rica em vapor de água em LP 890-9c, que é cerca de 40% maior do que a Terra e completa uma órbita em torno da pequena e fria estrela a cada 8,5 dias.

Estes critérios sugeriram que era um dos melhores alvos para o Webb estudar entre os planetas terrestres conhecidos e potencialmente habitáveis, para além do sistema TRAPPIST-1.

"A professora Kaltenegger e eu pensávamos que este exoplaneta poderia ser um excelente alvo para o JWST," disse Barrientos, "mas agora provámos esta hipótese e que LP 890-9c pode, potencialmente, revelar se a vida é possível no limite - o limite interior da zona habitável."

Os modelos da sua equipa são os primeiros a detalhar as diferenças nas assinaturas químicas geradas por planetas rochosos perto do limite interior da zona habitável, com base em variáveis que incluem o tamanho do planeta, massa, composição química, temperatura e pressão à superfície, altura da atmosfera e cobertura de nuvens. Os cálculos foram fundamentais para estimar o tempo que o JWST necessitaria para confirmar a composição básica de uma atmosfera - a existir uma.

Os modelos abrangem vários cenários que se pensa refletirem as fases evolucionárias dos planetas rochosos, desde uma "Terra quente" onde a vida ainda é possível, até um Vénus desolado com uma atmosfera de dióxido de carbono. No meio estão fases que a Terra deverá experimentar à medida que o Sol se torna mais brilhante e mais quente com a idade, fazendo com que os oceanos se evaporem gradualmente e encham a atmosfera de vapor antes de entrarem em ebulição total.

Não se sabe quanto tempo demoram esses processos e os astrónomos dizem que LP 890-9c fornece uma rara oportunidade para explorar essa evolução.

"Este planeta é o primeiro alvo onde podemos testar estes diferentes cenários", disse Kaltenegger. "Se ainda for uma Terra quente - quente, mas com água líquida e condições para a vida - então o limite interior da zona habitável poderá estar repleto de vida. Se virmos que já é totalmente semelhante a Vénus, então a água pode perder-se mais depressa do que esperamos".

No artigo complementar, Kaltenegger e colegas propõem que o JWST possa confirmar a presença de uma atmosfera - e se é principalmente vapor de água - em apenas três trânsitos, ou passagens do planeta em frente da sua estrela hospedeira. Se forem necessárias mais observações, estimam que um total de oito trânsitos poderiam detetar uma atmosfera semelhante à de Vénus, enquanto 20 trânsitos poderiam encontrar provas de um cenário de "Terra quente" potencialmente habitável.

É possível que LP 890-9c não tenha atmosfera e não albergue vida, ou que se assemelhe a um Vénus com nuvens espessas que bloqueariam a reflexão da luz e, portanto, produziriam pouca informação. Uma investigação mais profunda promete fornecer pistas valiosas, disse Kaltenegger.

"Não sabemos como poderá ser este planeta no limite da habitabilidade, por isso temos de o observar", disse. "É disto que se trata a verdadeira exploração".

Fonte: Universidade Cornell

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