Revelados os primeiros dias da Via Láctea
Impressão de artista dos primeiros dias da Via Láctea.Crédito: Gabriel Pérez Diaz, SMM (IAC)
O Universo, há 13 mil milhões
de anos atrás, era muito diferente do Universo que conhecemos hoje. Sabemos que
as estrelas se formavam a um ritmo muito elevado, dando origem às primeiras
galáxias anãs, cujas fusões fizeram surgir as galáxias atuais mais massivas,
incluindo a nossa. No entanto, não era conhecida a exata cadeia de eventos que
produziram a Via Láctea. Até agora.
Medições exatas da posição,
brilho e distância de aproximadamente um milhão de estrelas da nossa Galáxia,
até 6500 anos-luz do Sol, obtidas com o telescópio espacial Gaia, permitiram
que uma equipa do Instituto de Astrofísica das Canárias (IAC) revelasse alguns
dos seus estágios iniciais.
"Nós analisámos e comparámos com modelos
teóricos a distribuição de cores e magnitudes (brilhos) das estrelas na Via
Láctea, dividindo-as em vários componentes; o chamado halo estelar (uma
estrutura esférica que envolve galáxias espirais) e o disco espesso (estrelas
que se formam no disco da nossa Galáxia, mas que ocupam uma certa gama de
alturas)" explica Carme Gallart, investigadora do IAC e a autora principal
do artigo científico, publicado na revista Nature Astronomy.
Estudos anteriores haviam
descoberto que o halo Galáctico mostrava sinais claros de ser formado por dois
componentes estelares distintos, um dominado por estrelas mais azuis do que o
outro. O movimento das estrelas no componente azul rapidamente permitiu
identificá-lo como os restos de uma galáxia anã (Gaia-Encélado) que colidiu com
a Via Láctea primitiva. No entanto, a natureza da população vermelha, e a época
da fusão entre Gaia-Encélado e a nossa Galáxia, eram desconhecidas até agora.
"A análise dos dados do
Gaia permitiu-nos obter a distribuição de idades das estrelas em ambos os
componentes e mostrou que os dois são formados por estrelas igualmente antigas,
que são mais antigas do que as do disco espesso," disse Chris Brook,
investigador do IAC e coautor do artigo. Mas se ambos os componentes foram
formados ao mesmo tempo, o que diferencia um do outro?
"A peça final do quebra-cabeças
foi dada pela quantidade de 'metais' (elementos que não são hidrogénio ou
hélio) nas estrelas de um componente ou outro," explicou Tomás Ruiz Lara,
investigador do IAC e coautor do artigo. "As estrelas no componente azul
têm uma quantidade mais baixa de metais do que as do componente vermelho".
Estes achados, com a adição de previsões de simulações que também foram
analisadas no artigo, permitiram que os cientistas completassem a história da
formação da Via Láctea.
Há 13 mil milhões de anos
começaram a formar-se estrelas em dois sistemas estelares diferentes dos que
então se fundiram: um era uma galáxia anã que chamamos Gaia-Encélado e o outro
era o principal progenitor da nossa Galáxia, quatro vezes mais massivo e com
uma maior proporção de metais. Há cerca de 10 mil milhões de anos, houve uma
violenta colisão entre o sistema mais massivo e Gaia-Encélado.
Como resultado,
algumas das suas estrelas e de Gaia-Encélado foram colocadas num movimento
caótico e, eventualmente, formaram o halo da Via Láctea atual. Depois, tiveram
lugar surtos violentos de formação estelar até há 6 mil milhões de anos, quando
o gás assentou no disco da Via Láctea e produziu o que conhecemos como o
"disco fino".
"Até agora, todas as
previsões e observações cosmológicas de galáxias espirais distantes,
semelhantes à Via Láctea, indicam que esta fase violenta de fusão entre
estruturas mais pequenas era muito frequente," explicou Matteo Monelli,
investigador do IAC e coautor do artigo. Agora fomos capazes de identificar a
especificidade do processo na nossa própria Galáxia, revelando os primeiros
estágios da nossa história cósmica com detalhes sem precedentes.
Fonte: Astronomia OnLine
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